domingo, 23 de novembro de 2008

A Promessa e a Viúva ou o Sagrado e o Profano


Quando se tem 17 ou 18 anos de idade, nem se imagina o que vem pela frente. Pensa-se, apenas, em aproveitar o momento e a hora, nada mais. Acho que foi isso, exatamente isso, que me contaminou naquela noite de 13 de janeiro, do um ano já distante mais de quatro décadas na contabilidade do meu tempo: 1963. Eu misturei o sagrado com o profano. Mas, já naqueles anos eu vislumbrava uma aproximação entre o sacro da veneração e da adoração com o pecaminoso e sujo do mundano, quando via os estandartes das procissões e os comparava ao pavilhão de um clube de carnaval dos meus agrados ou dos meus mimos: Os Brotinhos. É tudo a mesma coisa, refletia comigo mesmo, em minha mente tomada pelos pensamentos do mundo. Por isso, fui à procissão e depois terminei fazendo uma visita à casa de Dona Sophia.

Eu tinha passado no vestibular de medicina e a mãe de meu colega, a quem na faculdade coubera o apelido de Jia, fizera uma promessa de que se fôssemos aprovados acompanharíamos a procissão, sustentando o andor, inclusive. Confesso que neste particular, força não tive para manter aquele enorme peso sobre os meus ombros, por mais que tentasse e por mais que quisesse cumprir o trato com os céus; trato, aliás, que não fora exatamente meu, como pode depreender o leitor. Mas, fizemos, eu e ele, o percurso todo com o préstito, cantando e rezando, de vela acesa na mão, como todo e qualquer penitente naquela noite. Lembro que andamos pelo pátio do colégio inteiro e que não precisamos sair na rua. Era, como muitos anos depois vim saber, uma procissão interna.

No final, vencido o tempo do sacro, o meu ilustre companheiro de tantas jornadas, fez o convite:
- Vamos à casa de Dona Sophia?

Eu não sabia bem de quem se tratava, mas logo, logo, fui esclarecido. O Jia disse da importância dessa visita, por se tratar de uma enfermeira – enfermeira prática, digo de pronto -, cujo convívio nos seria muito útil, explicava o colega que viria a ter o cognome de um batráquio importante. Poderíamos nos iniciar na profissão de Hipócrates assim, através dessa salutar amizade. De mais a mais, complementou o grande anfíbio, era mulher de predicados femininos qualificados como interessantes e tinha por hábito, sendo uma balzaquiana, na linguagem do tempo, não resistir aos encantos de um quase adolescente como éramos nós dois. Concordei, mesmo sabendo que a intenção não parecia ser das mais puras. Fomos lá, batemos e ela abriu a porta com gosto e graça.

- Boa noite Dona Sophia! Como vai a senhora?

Depois dessa saudação simplória o Jia fez a apresentação de praxe:

- Apresento-lhe o meu amigo Geraldo Pereira, calouro, como eu, de medicina, recém aprovado, também, no vestibular.

E ela, muito entusiasmada com as presenças, mostrou as cadeiras e acompanhou com a vista cada um de nós. Sentamos e aceitamos a cerveja estupidamente gelada que nos ofereceu. Em poucos minutos já estava tão próxima que parecia uma velha amiga de cinco ou seis anos atrás. E quase a queima roupa me indagou:

- Explique o que é o Monte de Vênus?

Eu não sabia, por hipótese alguma, mas a explicação veio rápida da parte dela, seguida da explanação quase científica da importância que tinha a protuberância feminina durante o intercurso sexual, quando servia de almofada aos movimentos dos amantes. Daí, justificou, a valia de se manter a pilosidade inteiriça, sem cortes e sem aparas, sem deplilação também, contrariando hoje todas as mulheres do mundo. Foi de tal forma sensual em sua descrição, que ainda hoje somos admiradores declarados dessa proeminência que dá graça e frescor à mulher. Com a discrição das senhoras de boa origem fez a demonstração prática e prometeu novas descrições anatômicas, contanto que nos iniciasse na matéria. Nunca mais esqueci isso! Lembranças sacras e profanas desse meu tempo distante, dessas iniciações de tantas décadas pra trás!

(*) - Lembranças de momentos que se encantaram no infinito de todos os pretéritos. Curiosidades inscritas agora em minhas recordações assim perpetuadas, na largueza do inteiramente virtual. Comente para pereira@elogica.com.br ou para pereira.gj@gmail.com Ou não comente, nada escreva ou nada deixe redigido.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

O Vagabundo da Praça


Aproximou-se a passos lentos, como se estivesse medindo as distâncias, mesmo conhecendo esses entornos de cor e salteado. Escolheu um dos bancos e estendeu no encosto o paletó surrado, sentando-se em seguida, não sem antes acomodar a seu lado a caixa de leite em pó cheia de revistas. Abriu uma dessas e passou rapidamente as páginas, detendo-se, aqui e ali, numa foto qualquer, sem que lhe importassem os textos. Retratos da sensualidade feminina à vista de um homem como outro qualquer, diferenciado, apenas, pela condição humilhante do analfabetismo, que inibe a cidadania. O cão ajeitou-se no chão, abriu a boca preguiçoso, fechou as pálpebras, jurando fidelidade que tantos desconhecem e quase ronca. O passante, que empurrava a carroça repleta de latinhas usadas - o lixo do luxo da burguesia -, com o filho a lhe ajudar no ofício, decidiu parar e descansar. Tirar um deforete, diriam os antigos!
Cumprimentaram-se e um diálogo nasceu! O vagabundo falava e gesticulava, argumentando com segurança, explicando, certamente, as suas idéias e os seus ideais. O interlocutor de ocasião retrucava o quanto podia, discordando, então, do pensamento alheio. A criança, absorta, acompanhava os dois na conversa, sem compreender bem de que falavam e o que discutiam. Não houve acordo e o moço forasteiro se alevantou, virou-se para o menino e fez o gesto universal, tocando a fronte com o indicador da mão direita: É doido! Seguiu em frente, voltou à faina da reciclagem do alumínio, garantindo a féria. Outra vez abriu uma revista, folheou com a mesma rapidez e se deteve na visão da nudez! O menino de rua, cheirando cola, quase senta, não fossem os latidos do cachorro. O cavalo que passou pachorrento, como cabe ser aos equídeos, nem ligou para os dois, mas por pouco não provocou um acidente grave, malgrado a precisão dos freios.
Do outro lado da rua, o vigia do prédio em acabamento descansava a sua monotonia sentado em cadeira de plástico, desdobrando um pedaço de papel com o qual se ocupou. Leu com vagar uma, duas, três vezes, se pouco e novamente acomodou aquilo que parecia um bilhete no bolso da camisa. Seria uma carta de amor, como aquela que amigo meu enviou para a mulher amada nos tempos da adolescência? Copiou de um livro especializado em declarações o conteúdo de uma dessas, que dizia: “A perspicácia que te caracteriza dá margens a que meu amor por ti se concretize...” E veio me pedir para corrigir! Ora, nem sequer sabia o que era perspicácia! Ou as palavras e as frases expressavam rupturas de uma paixão? O que lera e o que sentira, ninguém sabe, ninguém viu, tampouco ouviu! Mas, preferiu distrair-se com as maluquices do personagem à sua frente, falando baboseiras – coitado! -, o discurso dos loucos de qualquer um dos nossos logradouros!
Um homem aproveitava o domingo para um extra e descia a fachada do edifício em equipamento de segurança duvidosa, rejuntando as pastilhas. O vagabundo prestou atenção à cena e não se conteve, versejou assim: "Se você cair/Não vai se ferir/Pois estou aqui/Para lhe acudir..." Dava esperanças ao pobre peão, dependurado como estava, sustentado por um cabo de aço. O empregado gritou lá de cima, repetidamente: "Doido! Doido! Doido!..." Diante desse vozerio todo, a mulher de um prédio mais antigo, de amplos e bem divididos apartamentos, apareceu na sacada. Vestia roupa de dormir, ainda, uma camisola curta, de transparência parcial, mas tinha as formas bem desenhadas de quem fora bonita na juventude. Já ia pelos quarenta, pouco mais ou pouco menos. O marido, mais ciumento que cuidadoso, puxou-a de volta. Afinal, não valia a pena essa exposição matinal. Quase repito a crônica de Veríssimo: “Uma Vizinha Maravilhosa”.
E os ponteiros do relógio se abraçaram, hora de se procurar o restaurante e degustar o bode bem passado. Mas, o maluquinho ficou, porque não tem o direito dos outros, o de se alimentar! O vigia também e o peão. Só a mulher de beleza pretérita sentou-se à mesa e pôde almoçar! Depois, foi dormir a sesta da tropicalidade. Acordou tarde e perdeu o sono à noite. Arrumou todo o guarda-roupa. Valha-me Deus do céu! Quantas peças?
(*) - Eis a crônica de um domingo qualquer, misturado às experiências de todos os sábados e de outros dias úteis e inúteis. Ou então, eis as minhas observações de um cotidiano repleto de convívios urbanos, mesmo que prefira a ruralidade da República Independente de Todas as Aldeias. Comente para pereira@elogica.com.br ou para pereira.gj@gmail.com Ou não comente, abstenha-se, nada escreva e nada pense. Ou
diga horrores! Faça, enfim, o que bem desejar.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Doido ou Abilolado

Como estudava no Colégio Nóbrega e o portão dos alunos era na rua do Príncipe, eu costumava flertar com aquela moça à saída das aulas sempre. Com a aproximação das férias, precisei tomar uma atitude, falar namoro, dizia-se à época. Fui bem aceito, mas os meus amigos do time de futebol e aqueles do papo de todas as horas nunca me dispensaram e o apelido da menina corria solto: “Boca de Caçapa”. Em função da jovem namorada usar uma prótese dentária frontal. Nunca entendi o caso, pois caçapa é o saco do jogo de sinuca; saco objeto de todas as tacadas dos craques da mesa. E a boca da suplicante não era assim tão feia. Ela foi das primeiras pessoas no Recife a migrar para os Estados Unidos, onde, aliás, morava um colega meu de Grupo Escolar, com quem cheguei a me corresponder por algum tempo. Ele, inclusive, conseguiu uma amiga que me escreveu, mandou fotografia, mas eu nunca respondi, porque de inglês pouco sabia. Mas, a foto levantava a auto-estima, sempre que olhava. Retrato grande, oferecido em inglês.
Essas coisas são interessantes, passam e depois de 50 anos afloram dessa forma, ao sabor da pena ou ao sabor do movimento dos dedos no teclado. Como emerge agora um outro namoro, com aquela quase vizinha, a quem sete vezes me acheguei e de quem sete vezes me distanciei, por iniciativa dela. Eu era um abestalhado, pois acabava o idílio – eu chamava desse jeito –, mas reatava, quando na radiola de sua casa rodava um disco tocando uma música, cuja letra de tão velha sequer a Internet é capaz de registrar: “Volta/Vem rever nossos jardins/Vem amor/Nunca mais te afastarás de mim!”. E a grande rede de computadores dispõe de tudo ou de quase tudo. Se o leitor puder me ajudar, que ajude. Não sei quem canta, só sei que ela tinha o hábito de ouvir Núbia Lafayette e Dalva de Oliveira, mas não posso confirmar de quem era voz tão maviosa, depois de tantas décadas vencidas.
Lembro, no entanto, que na rua apareceu um figurante novo, um gaúcho, filho de um aviador – era o nome que se dava –, comandante da velha Pannair do Brasil, falando com o sotaque que impressionava e impressionou a penitente, encantando-a. Ele não dizia “Você”, engolia as letras e pronunciava apenas o “Cê”, de forma que tendo me encontrado, eu de bicicleta e ele andando a pé, numa volta que dei no quarteirão, de reconhecimento, buscando a presença de intrusos, me abordou: “Cê” já comprou alguma coisa para casar com Estela (nome fictício)? Ao que respondi: “Não! Só tenho 14 anos de idade e não penso em casar!”. Mas, o nosso amigo “Cê” já tinha providenciado um liquidificador e a louça do café. A namorada, não precisa adiantar, com a mesma idade, foi bater nos braços do outro e eu fiquei a ver navios mais uma vez. Depois dessa ruptura e dessa oportunidade, nunca mais a vi, senão uma vez, queixando-se da vida e do casamento. Mas, não casara com “Cê”! Talvez tenha sido a minha vingança!
Naqueles anos os namoros e os contactos todos entre meninos e meninas eram sempre muito distantes. Passava-se uma semana para se pegar na mão e um mês para se enlaçar a moça com os braços sobre os ombros. Um beijo simples se dava aos seis meses e a boca era território sagrado, sendo abordada com um ano, se a memória não me trai. Por isso, me admirei muito quando a babá de casa quase me seduziu, aos 11 ou 12 anos de idade. Não se falava em pedofilia naquela década agora tão distante. Mas hoje em dia, teria sido um caso para qualquer programa de polícia, prato cheio para o espaço televisivo de Datena, o apresentador da tarde. E parodiando o mestre Paulo Cavalcanti: “O Caso eu Conto como o Caso Foi”. Lembro que tendo sido criado com vó, só tinha dois caminhos: Ficar doido ou abilolado. Fiquei doido.
Era uma tarde de janeiro, penso eu, caia uma chuva-de-caju, com tudo a que tinha direito: raios, relâmpagos e trovões. Estavam reunidas no alpendre as mulheres de casa: minha avó, minha mãe e a tia mais nova. Mandaram que fosse tomar banho e designaram a babá recém chegada para me enxugar. De nada serviu dizer que não precisava mais desses serviços ou desses achegos e até desses aconchegos. O medo da gripe assustava toda gente e a moça, vencido o meu tempo na água, subiu os 17 degraus da escada e adentrou o banheiro. Quando abriu a toalha eu já estava de pé numa cadeira antiga, de cor preta, trazida de encomenda da casa de minha avó materna. Uma preciosidade de móvel, pintada depois – em reparação? – de branca. Não entendi a perplexidade da criatura, nova também, talvez nos seus 16 ou 17 anos de idade.
Aproximou-se e me enxugou como nunca tinham feito, com todos os afagos do mundo. Um certo exagero, imaginei! Depois, me chamou para o quarto, com a desculpa de me vestir e tendo aberto as pernas mostrou as suas intimidades, dizendo: “Passa aqui!”. Eu não sabia bem de que se tratava. Tinha ouvido o galo cantar, mas sem noção do terreiro. Era uma idéia vaga, a partir de uma conversa com o grande Sérgio Jibóia, Cacique Moroubixaba Primeiro e Único. Fiquei de tal forma transtornado – o leitor compreende –, que não podia sair dali, mesmo ouvindo um carão: “Menino! Avia! Para com isso! Fica normal!”. O normal era aquilo mesmo, aquela situação inusitada que tinha passado e ainda passava. E as coisas continuaram, sem uma finalização, é claro. Um dia, talvez como forma de cortar a situação, estranha para mim, ou mesmo como uma maneira de expiar minhas culpas, denunciei a menina, pelo simples fato de não ter trazido um copo d’água: “ Papai! Damiana (nome fictício) vive me mostrando o pipi!”. Imagine o leitor o que houve! Meu pai queria prender a moça e no dia seguinte, sob a proteção de minha avó – sempre minha avó – a criatura pegou a maleta e se foi. Se arrependimento matasse eu era um homem morto. Valha-me Deus do céu!
(*) Um artigo dos meus anos e dos meus tempos. Lembranças pitorescas, dolorosas ou generosas, dos meus dias. Uma indagação também ao leitor sobre a letra de uma música que me ficou gravada, em parte apenas, na memória. Comente se desejar ou não comente. Use os e-mails pereira@elogica.com.br ou pereira.gj@gmail.com

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Desrespeito à Autoridade

Trabalhei como médico de um Sindicato de trabalhadores e cheguei a ser Diretor do Serviço. Outros colegas, inclusive alguns – dois para ser preciso – que são leitores deste espaço, foram também funcionários dali, sendo um desses diretor, também, por um período. Havia uma convivência fraterna, pois nos encontrávamos fora do ambiente de trabalho, sobretudo às sextas-feiras, quando reuníamos o Bataclan, um pretenso clube voltado aos acepipes – camarão e lagosta –, degustados ao sabor de uma cerveja bem gelada. Vez ou outra, na casa de um colega designado, havia uma partida de dominó e ríamos às bandeiras despregadas. Na verdade, Bataclan era um nome emprestado de uma novela da Globo, tendo um sentido completamente diferente do nosso, vez que era o nome de um cabaré. Conosco havia uma pureza primitiva ou uma quase inocência.
Mas, o cotidiano era um número, pois driblávamos a vigilância, ombro a ombro, do Presidente, o Sr. Luiz Galhardo (nome fictício). O homem vivia prestando atenção a tudo e a todos, me chamando por qualquer razão. Certa vez, tendo passado por um consultório fechado, ouviu o típico e insubstituível ruído das pedras de dominó. Mandou, então, me requisitar e o fez enfurecido. Eu já sabia da reação e fui matutando uma saída. Sabendo que o homem cultivava certos hábitos conhecidos nas rodas da malandragem como taras, inventei uma história. E expliquei: “É, Senhor Galhardo, os meus colegas estavam discutindo um caso de perversão sexual e o dominó era uma barreira, para que não fossem ouvidas as considerações.” O homem ficou curiosíssimo, queria porque queria detalhes e eu com a minha habitual matreirice, apenas repetia: “Desculpe! Mas, é segredo médico!” Não havia nada, nem perversão, nem reunião de discussão. O que havia mesmo era um jogo de dominó para encher um intervalo. E eu cansei de dizer aos colegas: "Nos intervalos joguem! Mas, pelo amor de Deus, não façam barulho!"
Correu à boca pequena que um jovem colega ortopedista ia ser demitido e o motivo era muito simples, costumava andar com a camisa aberta, um cordão de ouro no peito e uma pulseira no mesmo metal no braço. Nesse tempo, o Governador de Pernambuco era um político jovial, habituado a esses adereços também, razão para defender o médico com a alegação de que era necessário que ele, o Presidente, mais habituado com a bajulação que com a reação, pedisse a saída, também , do mandatário maior. Com isso, o Galhardo botou o rabo entre as pernas e desistiu da demissão, mas nunca deixou de marcar o profissional. Foi quando aconteceu de outro ortopedista manifestar o desejo de se demitir. E eu: “Não agora! Você fica na reserva, quando ele disser que precisa demitir alguém, vai você!”. E assim foi feito, não sem a admiração ou a perplexidade do Galhardo: “Fica fulano e sai sicrano?”. Quase não faz! Tinha amizade ao demitido.
Depois, surgiu um novo o boato: eu seria demitido. Aquilo para mim seria péssimo. Eu ganhava pouco, mas o salário me servia, somava-se no final do mês ao que fazia na Universidade e ao que recebia do Estado. Montei uma estratégia junto ao colega Ptolomeu (nome fictício), pedindo que ele entrasse comigo no elevador e dissesse em alto e bom som que eu seria chamado para Secretário de Saúde. É que o jovem Governador estava de saída e outro assumiria, como é natural, sempre. Foi dito e feito. Em certa tarde, entramos juntos: eu, Ptolomeu e o Galhardo. Ptolomeu colocou o braço em meu ombro e disse com sua voz gutural: “Já soube da novidade: você será o Secretário de Saúde!”. E eu, mascarado, como faz qualquer jogador de futebol, sem aceitar bem a afirmativa, não negava. Deu certo, fiquei mais um pouco.
Mas, o diabo é que o gestor estadual decidiu por uma visita do Sindicato, eu fui chamado, porém julguei que seria uma temeridade comparecer e lá não fui. Quando o secretariado foi nomeado, o Presidente não hesitou e atirou forte: “Pensei que o senhor seria Secretário!”. Ao que respondi: “É! Não aceitei! Fiquei, entretanto, na retaguarda e vou orientar todas as decisões do ocupante. Acabo de chegar de Palácio.”. Um tempo a mais garantido! Até o dia em que mandou me chamar urgente e eu disse que tinha vários doentes por atender e assim que terminasse o procuraria. Fui demitido por desrespeito à autoridade. Bolas!

Crônica que vai oferecida ao meu ilustre colega Almir Peter, encantado para o infinito das coisas, Presidente perpétuo do Bataclan. Comentários para pereira@elogica.com.br ou para pereira@gmail.com