sábado, 14 de setembro de 2013

Um enorme vazio

   
Há um enorme vazio em meu ser: a minha mãe encantou-se. Desapareceu para sempre! A minha orfandade completou-se! Parece existir um buraco atrás de mim, como se as referências pessoais estivessem perdidas. Não tenho mais os meus pais dentre os viventes deste mundo. Esse é o destino de toda gente, mas a perda é uma ruptura grande. Rompe-se, de um momento para o outro, esse elo parental, que serviu para reunir a constelação familiar. Não há mais o telefonema matinal, antes das 7 da manhã e a indagação do hábito: “Alguma novidade?”. A novidade, minha mãe, é a pior possível, a sua morte me deixou esmaecido.
Uma via-crúcis de quase de cinco anos, em lento e progressivo padecer, tudo sob a vigilância da filha, Fátima de prenome, que deu grande parte da vida pelo bem estar da mãe. Dias e dias nesse sofrer, sem ganho, porque a condenação à imobilidade chegou logo e ela foi se entregando. Uma professora que fez a opção doméstica, que criou seis filhos e acompanhou o marido dia após dia em sua doença, sem reclamar. Mulher saudável, sem doença, senão uma demência senil que a condenou, no fim da existência, a viver sem saber exatamente as razões.
Uma lágrima que rolou pela face em certa ocasião, foi vista por mim como uma forma de expressar a sua satisfação com a minha presença. Ou o fechar e abrir dos olhos, significando que estava sabendo de minha chegada. Formas, talvez, de se enganar, diante do inexorável das coisas. No derradeiro dia, chamado para a despedida, beijei-lhe a têmpora, mas o gelo da morte mostrou que estava decretado o fim. Ainda pude agradecer as noites mal dormidas, os dias devotados a mim e os momentos em que me acolheu em seus braços. Agradecer, sobretudo, os esforços para que estudasse, tivesse uma profissão e vencesse. Ninguém vence sem ter uma mãe na retaguarda.
Eu fui um menino difícil, levado da breca, dizia a minha avó. Complicado para aprender matemática, a conta de dividir principalmente. E ela sempre muito paciente suportou tudo, inclusive as vezes em que subia no



muro e me arriscava a cair. Pedia que descesse dali e o fazia com uma calma tão grande que sensibilizava. Foi a mais devotada de todas as mães, a mais dedicada e se hoje sou alguma coisa, escrevo e sou lido, devo a ela.

(*) - Texto publicado hoje, 14 de setembro de 2013, no Jornal do Commercio, do Recife, ainda a propósito do encantamento de minha mãe para o infinito das coisas. O leitor que desejar comente no espaço mesmo do Blog ou o faça para o e-mail pereira.gj@gmail.com