quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Um trote benfazejo

             Passei um tempo de minha vida – dez anos se muito – dando consultoria a um laboratório farmacêutico. Dava aulas ao que eles chamavam força de trabalho (os propagandistas), tirava as dúvidas surgidas durante as visitas e uma vez ou outra tinha que promover reuniões com colegas médicos sobre um produto novo, um lançamento a ser realizado. Mas, o que interessa dizer é que o meu chefe em São Paulo, um jovem cirurgião vascular, morreu, acometido por uma morte súbita. Entrou o novo chefe, um camarada moleirão, medroso, cheio de nó pelas costas, como diria meu pai.

Pouco depois dessa mudança, fui eleito e nomeado Diretor do Centro de Ciências da Saúde (CCS), da UFPE. O CCS reunia todos os cursos da área de saúde, incluindo o de medicina, de cujo programa eu participava. O novato notou que eu estava tendo alguma dificuldade em cumprir com os compromissos, mas não tinha ainda desistido do lugar de Consultor. Era um ganho a mais no salário, recebido em banco próspero no Recife, dos primeiros a implantar a figura do caixa eletrônico, hoje tão comum. Ótima a sistemática, porque parava o carro na Agamenon Magalhães e sacava o dinheiro do final de semana ou o necessário à gasolina.

Certo dia, em meu Gabinete de Diretor recebo um telefonema do novato, mais ou menos nesses termos:

- Geraldo? Tudo bem com você? Estou lhe telefonando para dizer que o seu novo cargo de Diretor, por certo lhe trará dificuldades para cuidar dos interesses da Companhia.

- Claro! Já estava esperando a sua ligação.

- Veja, eu vou combinar por aqui, com o jurídico, como fazer a sua indenização e depois lhe telefono. Gostaria, no entanto, de lhe pedir que esse seu desligamento fosse mantido em segredo, porque sei de suas amizades no Recife e não quero que haja prejuízo para a empresa.

 

É interessante, pois a Companhia está sempre em primeiro lugar e a criatura vem em segundo, quando muito. De toda forma, procurei um advogado especializado em Direito do Trabalho e ele me disse que pedisse R$ 15.000, 00, para receber mais ou menos R$ 10.000, 00. Não preciso dizer que a quantia nos anos noventa, logo depois da reforma monetária, era um bom pagamento para os dez anos de empresa. Guardei o segredo e continuei a vida, mas o danado do Chefe cortou o meu pró-labore do mês, antes de qualquer acerto. Fui ao caixa eletrônico e não encontrei nada. Vivia-se a primeira das eleições de Lula e eu bolei um trote; um trote a ser deixado na secretária eletrônica do novo Chefe.

 

Liguei pra ele na hora do almoço e ouvi a mensagem: “Deixe o seu recado:”

 

- Feliciano você me pediu para não dizer nada a ninguém e você mesmo disse. Ligaram-me de uma revista de grande circulação (dei nome aos bois), pedindo uma explicação sobre a minha saída. Respondi que ligassem à tarde, depois das 15 horas.

 

Nunca uma pessoa me retornou tão prontamente, quanto aquele efêmero figurante de minha vida. Louco, verdadeiramente louco. Disse-lhe que como ele já rompera com o pacto e como eu não recebera o pró-labore, diria tudo. O homem quase chora com a confusão que se instalou e disse que era tudo culpa “desse PT que deseja o poder a todo custo.”. Disse para não se preocupar, mas continuar a guardar o segredo, porque da parte dele o pacto estava de pé e o meu dinheiro seria depositado.

 

E assim foi feito! Quando voltei pra casa, depois de uma tarde de trabalho, o saldo apontou o depósito e eu passei o final de semana com o último pró-labore na conta.