segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Trono Escatológico

Eu estava aqui, no recesso do lar, dizia-se outrora, refletindo sobre as grandes mudanças do século XX, para o livro que venho escrevendo há anos, mas que não consigo publicá-lo, porque toda vez que penso nessa iniciativa o texto já está desatualizado. As coisas evoluem numa velocidade extraordinária. Incrível isso! Mas, lembrava o Palácio Imperial que visitei em Petrópolis e fazia a comparação do ontem das coisas com o hoje dos dias, até porque comprei e estou lendo o livro de Mary Del Priori, intitulado: “Histórias Íntimas: sexualidade e erotismo na história do Brasil”. Livro que se ocupa de muitos detalhes da sociedade colonial, além da sexualidade e do erotismo. Estou lendo também as cartas do Imperador Pedro I à Marquesa de Santos! Eita bichinho impulsivo danado! Puxou e aprendeu bem a lição com Carlota Joaquina, mulher de Dom João VI e a mãe dele.

Admirou-me muito o fato de encontrar, como era no pretérito, a cozinha fora do edifício principal do Palácio. Dali as refeições seguiam para a sala de jantar em depósitos especiais, para que não esfriassem. Pois é, nesse tempo e eu ainda vi, usava-se a lenha ou o carvão vegetal e a fumaça por certo que manchava a pintura da dependência e de mais a mais o calor era infernal. Só os escravos – coitados! – suportavam temperaturas assim, tão altas. Hoje os fogões são de cerâmica vitrificada, como vi em Espanha, em casa de filha minha e praticamente não oferecem risco. Eu ainda uso o gás de conzinha encanado no prédio. Não preciso mais de bujão, esse horror dos tempos.

Acho, no entanto, que o banheiro foi o cômodo que mais evoluiu. Era fora de casa, inicialmente, trazendo enorme desconforto para quem dele se utilizasse. Imagine o leitor, acordar altas horas da noite, para se servir de um sanitário fora dos limites domésticos ou quase isso! É verdade que existiam os urinóis, os quais amanheciam cheios de urina, quando não de fezes também. Ainda peguei isso! A minha avó usava religiosamente a sua peça, grande e larga. Pela manhã eram os empregados ou os escravos antes da abolição que tinham como obrigação jogar na rua o excremento dos seus patrões ou dos seus senhores. Claro que com a minha avó já era diferente! Há por lá, em Petrópolis, assento, que talvez tenha sido a forma mais desenvolvida para a época de se usar o sanitário. Uma cadeira aberta, onde existia um vaso, que podia ser retirado e reposto, à necessidade do cliente.

Outra coisa que também avançou e muito foram os ferros de passar. No começo eram peças que esquentadas faziam o estirar dos tecidos, depois um material com brasa em seu interior, até os modernos, que ligados à eletricidade são capazes de passar a roupa, inclusive borrifando o pano, sem precisar jogar água como no passado, quando a empregada exercia o mister com um molambo molhado a jogar água no tecido. Por fim, a máquina de lavar, uma beleza, porque evita uma liturgia que seguida como era levava horas para o quarar e o secar. Ninguém precisa mais quarar nada, os jovens desconhecem o significado do vocábulo.

Mas, o que mais me impressionou foi o trono do Imperador; trono escatológico.

(*) O Blog vem sendo publicado no jornal virtual A Besta Fubana. O texto de hoje dá continuidade aos que já escrevi sobre minha viagem ao Rio, uma reciclagem cultural disse quando as divulguei. O leitor que desejar comente no espaço mesmo do Blog ou o faça para pereira.gj@gmail. ou pereira@elogica.com.br

domingo, 14 de agosto de 2011

A Felicidade


Realmente, foi muito bom ter a família reunida em torno da mesa no dia dos pais. Eu sei que é uma data criada pelo comércio, para movimentar as lojas que já estavam com o apurado em baixa. Afinal, em agosto não há data a se comemorar e o marketing inventou essa, mas mesmo assim é bom, traz uma paz diferente à alma de cada um. Permite aos filhos se encontrarem e outra vez voltarem à condição de crianças, com as brincadeiras que são retomadas. Foi assim a data para mim, a casa cheia, o vozerio tomando conta do dia, como outrora, cada uma que lembrasse uma coisa e que desse uma risada maior que a outra e depois o almoço. A mesa posta, a comida servida, o vinho espanhol aberto e os copos abastecidos.
Sim, o vinho espanhol aberto, porque foi filha a mais velha quem trouxe, em março e aqui ficou esperando um momento como o de agora, para ser oferecido aos convivas, como forma de se confraternizar e de saudar a data. Ela também participou, embora distante, em terras de Espanha, aproveitando o milagre do computador e presente na telinha de um ipad. Foi dela a mensagem linda que recebi: "Pai, não é preciso dizer que você é um PAI maravilhoso, isso você sempre soube... então quero que saibas mais uma vez que além de maravilhoso é um PAI: PRESENTE, CARINHOSO, ATENCIOSO. Enfim, É UM GRANDE PAI. Pois é painho, lhe desejo um Dia maravilhoso que você merece mais do que ninguém. Hoje sou uma pessoa feliz e sei que minha felicidade é resultado de tudo o que vivi e aprendi com você. "
Essas coisas, isto é a família novamente reunida, as filhas esbanjando satisfação, os genros integrados, os presentes recebidos – a camisa de uma e o relógio de outra –, junto com essa mensagem que li ao despertar, me deixaram absolutamente certo de que valeu a pena o esforço, às vezes tão difícil, de criar e educar, que levamos a efeito, eu e minha mulher, há tantos anos minha companheira. Chego a dia como este apenas para aportar em cais dos meus afetos, como se dirigisse uma embarcação de bom porte, para comemorar uma escala a mais na trajetória que espero longa de minha vida.
É claro que faz falta o pai que se foi! Recordo o último dia dos pais que passei com ele, quando indaguei que presente gostaria de receber. Um dicionário de Aurélio foi a resposta, sem imaginar, ele próprio, que o computador estava chegando e com ele a Internet, trazendo o milagre dos textos on line, com diversos dicionários assim disponibilizados e com a versão do que ele desejava e eu o presenteei já digitalizada. O dicionário e tantas outras obras que tenho agora na memória de meu equipamento. E ele se foi, nunca mais dele tive notícias. Nada mais que sonhos, que representam a forma onírica da presença e da lembrança. Ficou a saudade! Um dia também me farei pó e deixarei a recordação em cada canto de meu viver. Mas espero em Deus não seja tão cedo!
Valeram a pena o dia e a data, as palavras de cada uma e os abraços! Sou feliz!

(*) Interrompo um pouco as considerações em torno dos nossos imperadores, para saudar o dia dos pais, mas hei de voltar ao tema. O leitor que me prestigia, comente o texto no espaço mesmo do Blog ou o faça por e-mail para os endereços: pereira@elogica.com.br e pereira.gj@gmail.com

domingo, 7 de agosto de 2011

Cavalo velho, capim novo

Se o leitor benevolente gostou da crônica anterior – A Fala do Trono –, há também gostar do que vi de pitoresco em minha viagem ou o que passei de pitoresco durante minha estadia na Cidade Maravilhosa.  É claro que não me admirei com o detector de metal, que em meu embarque disparou e não houve jeito de parar. Essas coisas assim, diferentes, acontecem sempre comigo. O equipamento só deixou de apitar quando tirei o cinturão, manobra que habitualmente só faço no banheiro ou no quarto, trancado em ambos os casos. Mas, no avião notei que um certo casal estava muito animado, a mulher sobretudo, muito falante e carinhosa, alisando o rosto do parceiro por nada. Resolvi passear no corredor da aeronave, para cumprir desiderato médico, e constatei que a penitente era uma amante bem mais nova que o homem, começando o relacionamento e muito feliz por isso. Estavam, portanto, em lua de mel.
Aliás, sobre isso, isto é sobre mulheres e homens, pude constatar um número grande de casais cujas parceiras eram bem mais novas. É que por força do dever conjugal, compareci a vários Shoppings e ficava sentado nos corredores, enquanto a patroa fazia o reconhecimento das vitrines. Realizava assim o que amigo meu denominou de “Observação participante”, quer dizer uma investigação antropológica quando o observador está na cena propriamente. Não é brinquedo o número de parceiros masculinos bem mais velhos que as esposas! Menina de seus 22 anos com velhos de 60 e mais anos de idade. Difícil entender esses casamentos, senão pelo metal, que é vil sempre. Defendem, por certo, a tese do cavalo velho, capim novo.
O mais engraçado, porém, é que tendo ficado em hotel de trânsito militar, a convite de coronel amigo meu, lugar no qual fui extremamente bem tratado, não sabiam bem se me consideravam civil ou se davam tratamento militar. Na dúvida, em certa manhã o recepcionista dirigiu-se ao porteiro dizendo: “Chama um taxi ai para o coronel!”. E ao chegar o veículo o aludido porteiro me convocou assim: “Coronel! Por favor!”. Muito pior foi quando disse ao motorista de um taxi em Copacabana pra onde ia e o homem desejando me dizer alguma coisa que já não lembro: “Coronel! Isto é, Brigadeiro e se justificou dizendo que é melhor errar pra mais, que chamar por patente inferior!”. É isso mesmo, quase digo! No refeitório ou no rancho um senhor muito atencioso levantou-se de seu lugar e disse: “Está lembrado de mim? Fomos contemporâneos na academia!”. Não sou militar, disse-lhe, apertando-lhe a mão em retribuição a tanta atenção. À saída já, depois de ter feito o pagamento, o rapaz da recepção precisou completar uma informação e ai trocou tudo e me chamou assim: "Comandante! Por favor!". Comandante, como aquele amigo meu, que tinha uma tropa de três soldados e eu não resistindo, disse-lhe: "Você é um comandante muito vagabundo!".
Com essa história lembrei de flanelinha das proximidades do Parque da Jaqueira, onde costumo caminhar. Só me tratava por coronel. Ora pau, pensei comigo mesmo, quem inventou que eu sou coronel? Um belo dia, chamei-o de parte e disse: “Olhe, você está me tratando por coronel e os meus subordinados ouviram. Como sou general eles se zangaram!”. E o homem trocou o tratamento. Ai aproveitei para completar o meu trote e à pergunta de onde morava, se perto ou longe, expliquei: “General não mora, acampa!”. E noutra ocasião, à chegada de minha mulher que vinha de uma caminhada, antes de mim, na Jaqueira também, completei a zombaria: “Essa é a major. A conheci no Haiti e estamos juntos desde então!”. Estou me preparando para informá-lo que fui promovido a marechal. Eu sei que não existe mais, porém ele não sabe disso e de outras coisas.

É isso mesmo, na dúvida pró réu, melhor chamar pela patente maior que pela inferior!

(*) Esta é uma crônica que relata apenas o pitoresco em minha viagem ao Rio. Passagens minhas e passagens alheias, coisas de quem sai do Recife e vai ver, com outros olhos, a Cidade Maravilhosa. O leitor que desejar pode comentar o texto aqui mesmo, neste espaço ou escrever para pereira@elogica.com.br ou ainda para pereira.gj@gmail.com O Blog é publicado também no jornal da Besta Fubana.