domingo, 25 de setembro de 2011

As lembranças, o parque e o neto.




Voltei no sábado, dia 24 deste mês de setembro, do ano da graça de 2011, aniversário, aliás, de minha filha Patrícia, ao Parque 13 de maio, aonde não ia há pelo menos 40 anos, penso eu. Voltei, porque desejava que o meu neto, que é caçador de aranhas asquerosas, visse o macaco Chico, recentemente evadido de sua jaula, conforme a imprensa e novamente capturado para concluir sua pena de privação de liberdade. No Brasil, curiosamente, só os bichos recebem a pena de prisão perpétua, dessa estando livres os homens de boa vontade. Fomos eu, meu neto, Pablo de prenome, e a avó dele, que tem sido ao longo dos anos a mulher que eu curto. Não sei se ele, o neto, tem conhecimento dessa curtição, mas é a verdade, nua e crua.

O Parque está desprezado, largado, qual mulher bonita separada do marido e quase sem segurança. Pouco lembra aquele recanto, que nos anos sessenta era o lugar de encontro da meninada em vias de iniciar a vida política, isto é, sensual e sexual. Foi por lá que vi certo médico do Recife, com uma jovem normalista no banco dianteiro de um Skoda, fazendo um esforço enorme para tirar a aliança do dedo esquerdo e dessa forma continuar a fiar conversa com a penitente. Não hesitei, confesso, fui lá, retirei o adereço matrimonial e lhe fiz presente, muito discretamente. Afinal, a causa me parecia justa à época! Aquelas alamedas, nas noites de meu tempo, foram palco de muitos abraços e de beijos roubados.

O Chico, macaco de meus objetivos, de logo se apresentou como candidato à pipoca do neto, “pipoca murcha”, como costuma dizer e se postou na jaula de seu viver, pedindo mais um caroço do acepipe da hora. Pablo não gostou da concorrência e deu um muxoxo de raiva. Melhor sair correndo, com a avó lhe acompanhando os passos, que continuar naquele exercício de observação de símios enjaulados. E assim o fez! Saiu em desabalada carreira pelos caminhos do parque. Nisso, por certo, repetia o avô, que em pretérito distante, ai pelos finais dos anos 40 ou começos dos 50, fazia igual proeza no Parque, razão para ser atropelado por uma bicicleta e ver o homem sendo preso e conduzido ao “buque”, como se costumava nomear a cadeia naqueles anos das grandes valsas. Foi a voz de minha mãe, com o seu jeito carinhoso de ser, que pediu pelo detido e o fez voltar às ruas.
Fui muitas vezes ali, pelas mãos de meu pai, que embora tivesse uma vida atribuladíssima, cuidava em se dedicar aos filhos nos feriados da existência. Era de lá que saia, de mãos dadas com ele, para observar o rio das capivaras correndo em direção ao mar e soltar um barquinho de papel, o qual em meu imaginário infantil ia ganhar o oceano e aportar distante. E era de lá, da rua da Aurora, que via o Dr. Agamenon Magalhães, como chamava meu pai, passeando de braços pra trás, às costas, na varanda do Palácio. Isso o fazia concluir que o Governador estava aperreado. Eu não entendia bem a razão, mas concordava, como fazem todos os meninos do mundo diante das afirmativas dos adultos.
Não havia mais por lá – notei isso –, os canários abarrancados de minha juventude, não vi sequer um desses pássaros. Todos desapareceram, diante da força avassaladora das máquinas do progresso. Um ou outro bem-te-vi fazia as honras do lugar, saudando os visitantes. À distância ouvi o trinar de uma sabiá – gongá. Gente da rua deitada nos bancos findava as horas de sono a que tinha direito, se bem que não dispusesse de cama bem cuidada e de colchão fofinho. São as diferenças sociais de que falam os sociólogos. Mas ninguém me incomodou nessa curta permanência no ambiente. Uma quase cigana, ao final, quis ler a mão da avó de Pablo, ensaiou uma perguntas bestas e se foi, descartada pela mulher amadurecida nos anos, mas de forma alguma velha. A avós de agora não são mais como foram as minhas, gordas, de cocó adornando a cabeça e avançadas nos anos. 

(*) A crônica de hoje, escrita com o domingo amanhecendo, é um ode ao neto Pablo, uma forma de lembrar dos anos que se foram e um jeito afetuoso de falar da mulher amada, sem esquecer de meus amores com os canários, as sabiás e os bem-te-vis. O texto tem sido sempre reproduzido no jornal virtual A Besta Fubana, de sua santidade o Papa Berto I. Comente no espaço mesmo do Blog ou o faça para os e-mails pereira@elogica.com.br ou pereira.gj@gmail.com

sábado, 17 de setembro de 2011

O Vassoureiro

Meu caro e distinto leitor, em tudo muito paciente comigo, vivi na quinta-feira, dia 15, uma noite magnífica, quando estive na Academia Pernambucana de Letras e conferi a exposição de quadros pintados em homenagem aos acadêmicos. Um pintor para cada uma das imagens e a obra de cada um dos confrades considerada no processo de criação. Ao entrar, me deparei com um quadro que identifiquei, de logo, ter sido pintado com base em crônica que produzi e publiquei, em jornal e em livro. Publiquei também nesse espaço do Blog. Uma beleza de quadro!

A autora, que já tinha me enviado um e-mail sobre a missão a que vinha se dedicando, a de identificar uma crônica que lhe tocasse a capacidade de captar e expressar sentimentos e a permitisse dedicar-se à criação pictórica, tem de uma sensibilidade à flor da pele, foi o que notei na hora. O quadro estava tão bonito, mas tão bonito que não cheguei a passar um olho no restante da exposição, como deveria. Coisa de menino criado com vó, embasbacado com a pintura bem cuidada e o quadro bem exposto. Trata-se de Lúcia Pedrosa, figura generosa e de fino trato, a quem conheci na noite de ontem, mas se identificaram parentescos dela com minha esposa. Um contraparentesco, na verdade. Coisas do Recife, cidade na qual se apertar todos têm afinidade parental.

Iniciativas assim, de se produzir em função de uma criação literária, nem sempre dão certo, porque o artista, como o intelectual, sente-se inibido com a encomenda. E de mais a mais, é possível que o pintor não atenda às exigências do escolhido para a empreitada. No meu caso, fosse lúcida minha mãe, diria que caiu a sopa no mel. Eu fiquei satisfeitíssimo e confesso ao leitor, chorei de emoção. Aqui por casa minha mulher, que comanda a companhia doméstica, já identificou lugar na parede para acolher o quadro, pois que por cima de tudo a autora fez a doação da obra. Dentro de 30 dias poderão os meus amigos apreciar o traço de Lúcia Pedrosa; traço, aliás, fotografado por sua filha Luciana, que faz dessa outra arte um agradável mister. E Luciana lá estava com Gabriela, o xodó da vovó. E eu deveria ter levado Pablo, el campeone, para que fosse se habituando às coisas do avô!

O que ela, a autora, pintou foi um personagem dos chamados “Pregões do Recife”, aquele que passava vendendo: “Espanador/Vasculhador/Colher de pau/Esteira d’Angola/Rapa Coco/E grelha.../Eu tenho quartinha”. E na crônica, há muitos anos publicada nas páginas do Jornal do Commercio, eu me referia a um velho amigo, companheiro dos veraneios de Pau Amarelo, ele morador de inverno a verão, que me brindou com o texto dessa forma de anunciar o que dispunha o homem em seu conjunto de vendedor ambulante, verdadeiramente ambulante. É uma pena não ter mais Silvio Costa entre nós, os que vivem ou sobrevivem, para partilhar comigo essa graça de ser assim homenageado. E nem da viúva sei mais, senão o seu prenome: Lúcia, também. O “Vassoureiro”, foi como a artista nomeou o quadro, fazendo alusão a essa personagem do passado da cidade. E ainda disse que era nostálgica como eu! Eu vinha afastando esse rótulo, mas é a verdade, nua e crua, queiram ou não queiram os juízes, como letra de conhecida música dos carnavais recifenses.

E eu me encantei com o “Vassoureiro”, porque o vi nascido de mim, também, depois de um consórcio bem cuidado com a artista.

(*) - A crônica de hoje é um quase ode à imagem que foi criada pelo imaginário de Lúcia Pedrosa, diante de uma crônica que escrevi há muitos anos, que reproduzi aqui, neste espaço virtual e que me resgata um pretérito distante, vivido e revivido. Que me resgata também a figura de um amigo, Silvio Costa, que se antecipou na viagem de volta e que me forneceu o material para o meu sonho, a minha quimera. Essa crônica é reproduzida pelo jornal virtual A Besta Fubana. Desejando o leitor, comente, aqui mesmo no Blog ou o faça para os e-mails pereira.gj@gmail.com e pereira@elogica.com.br

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Caçador de Aranhas Asquerosas

Ao leitor eu justifico, com especial carinho e muito respeito, o fato de ter que deixar de lado os temas de minha viagem ao Rio de Janeiro. Ainda há o que tratar por aqui, seja da viagem propriamente ou dos livros que comprei por lá, mas sucede que chegou em terras tupiniquins o meu neto, Pablo de prenome, vindo das distâncias espanholas e eu fiquei dedicado à criança, dedicação exclusiva ao menino. Por isso, volto ao Blog com uma crônica especialmente voltada para ele. Depois, quando cessar esta fase aguda da netite, como chamava meu pai a doença do avô, hei de retomar a temática.

A verdade é que tendo o avião estacionado no pátio do aeroporto, liberada a criança e sua mãe pela fiscalização da aduana e recebidos pelas irmãs e tias no saguão, enquanto nós outros, avô e avó, preparávamos a casa em Aldeia para recebê-los, o jovem não hesitou e indagou de pronto: “Cadê a vovó?”. A vovó desde a vez passada que é o xodó dele, porque passa o tempo todo de suas folgas disponível, a ponto de na solenidade de minha posse na Academia Pernambucana de Letras, dizer, em alto e bom som, quando batiam palmas para o meu discurso: “Viva vovó!”. Um merecido viva para quem como ela tanto vibrou com a minha festejada entrada.

Mas por aqui a rotina tem sido braba, pois que desde as 5 da manhã já estamos a postos, para o lúdico de suas travessuras. “Vovô: vamos colocar comida para os passarinhos!”. E a foi comigo levar o mamão que os pássaros bicam o dia inteirinho, sendo do timbu o que sobra à noite. Passou a manhã quase toda deitado na grama do jardim, como se aquele capim fosse a sua floresta particular. O que chama a atenção, porém, é que ele se intitula “Caçador de Aranhas Asquerosas” e com um cipó na mão, à conta de uma espada, bate com força em cada obstáculo que encontra. O caçador, inclusive, só não destruiu uma escultura comprada em artesão importalog cnte, porque a madeira é daquela que cupim não rói, como dizia minha mãe nos tempos de lucidez.

Dia desses quando saímos à caça, diante de minha insistência para voltarmos, disse: “Senta ai vovô!”. E me apontou uma madeira que estava na via principal aqui o Condomínio. Hoje pela manhã fomos ao açude grande e ele entrou na piscina de águas frias do lugar. Ficou tremendo de tanto frio, tiritando, até ser devidamente enxuto pela mãe.

É isso! Morrem uns e nascem outros! É o grande carrossel da vida, alguns não suportam a velocidade do girar constante e caem 

(*) O Blog, criado aqui, no amanhecer sereno de Aldeia, vai publicado sem ilustração alguma, sequer uma foto do Caçador, porque a lentidão da Internet é tanta que não permitiu isso. O leitor que desejar comente no espaço mesmo do Blog ou o faça para os e-mails: pereira@elogica.com.br ou pereira.gj@gmail.com