No meu tempo de menino nascido em plena guerra e criado no conturbado período do pós-guerra, vigorava a sentença: a economia é a base da prosperidade. Eu não sabia muito bem de que se tratava, mas imaginava que era coisa boa, por isso, em pequeno cofrinho de metal bem pesado, no qual havia a inscrição ipsis literis, eu cuidava em guardar minhas moedas, tostão por tostão. Não abria o miareiro por dinheiro nenhum, senão quando precisava tomar um sorvete de ameixa na esquina e me faltavam os cobres paternos. A família me estimulava o hábito – o hábito faz o monge, diziam –, contribuindo, vez ou outra, com aquela poupança pueril. A minha avó, sobretudo, cuidava em me incentivar e com isso acompanhava o gesto a tempo e a hora, como costumava dizer.
Mas, era rigorosa com o risco do menino se acostumar com dinheiro no bolso. Isso porque andei economizando uns trocados, que me eram dados para o guaraná de todos os dias e já trazia a carteira recheada com notas de pequeno valor. Notas do velho cruzeiro; de 1 ou de 2 cruzeiros, nada mais que isso. Uma ou outra cédula de CR$ 5,00 – duas no máximo –, aquelas de cor escura, de um cinza forte, de aspecto feioso. Pois me tomou a carteira e recolheu o dinheiro, sem que eu saiba, até hoje, o destino que deu às economias que vinha guardando. Fiquei possesso, confesso, chorei feito um bezerro desmamado e disse horrores a ela, coisa que não fazia de hábito. Mas essa, francamente, foi demais.
Era um tempo de vacas magras, como se dizia quase todos os dias, sendo o meu pai o único provedor – não se usava a mulher trabalhar –, para sustentar seis filhos, a mãe (minha avó), uma tia velha e a irmã, além de 4 empregadas. Só sei que Dona Lila, na tesouraria parental, fazia milagres e curtiu muita preocupação com a falta do metal, nem sempre vil. A minha tia velha – Deolinda de prenome e Déo por apelido – era mulher sem recursos, sem uma pensão que fosse, pois foi noiva a vida toda de um soldado que morrera na Guerra do Paraguai. Nem sei bem se isso aconteceu de verdade ou se ficava no terreno das lendas ou das fábulas parentais. Afinal, a beligerância fora na década de sessenta do século XIX. Mas, sem eira nem beira, costumava jogar no bicho todos os dias. Tinha uma caixa de fósforos com pedacinhos de cartolina dentro, os quais lhe indicavam o palpite a cada manhã. Era difícil tirar alguma coisa, senão raramente na borboleta, quando se inspirava nesses insetos que visitavam o jardim com o jasmim dos gostos de meu pai.
Uma vez, não sei porque cargas d’água, achei na rua um dinheiro perdido. Não tive como fazer como fez o servente do aeroporto, que devolveu ao dono as joias que encontrou. Ignorava quem perdeu aquele terém e fiz a festa, é claro. Comprei logo um sorvete com duas bolas do mesmo sabor de sempre: ameixa. Entrei na bodega defronte e escolhi as balas que desejei, os chocolates “peixinho” que adorava e as cigarrilhas que não se fumava, mas se comia. Beleza! Nunca mais encontrei nada, senão muitos anos depois, em Paris, num apartamento emprestado, daqueles que aparece nas telas do cinema, nos quais a cama do casal se transforma em guarda-roupas. Um brasileiro tinha deixado o quarto e eu assumira seu lugar. Tomara, certamente, um pileque de vinho e deixara cair sob a cama 500 libras. Devolvi à dona da casa o dinheiro, mas estando já no final da viagem, foi incômodo suportar a restrição dos derradeiros dias com uma disponibilidade extra no bolso. Mas, falou mais forte a ética da vida, aprendida em casa, em meu cotidiano, nas lições de meu pai e no comportamento de minha mãe.
Comigo sempre foi assim: "Dinheiro na mão é vendaval..."
(*) - Coisas de ontem e de hoje! O pretérito de meus anos encantado assim no infinito das coisas. Mas, o agora de meus dias numa rotina diferente e agradável. Pena que os anos passaram e a paz, a felicidade e a tranquilidade do tempo demoraram, mas chegaram! A idade me trouxe a harmonia! Comente no espaço mesmo do Blog ou o faça para pereira@elogica.com.br ou ainda para pereira.gj@gmail.com
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluir