O
meu imaginário toma corpo nesse dia dos pais; toma corpo e ganha os ares, viaja
como se fora o pássaro dos anos e vai resgatar lá atrás a figura de meu pai. Consigo me transportar até o começo de tudo –
os meus inícios – e vou me encontrar na casa em que nasci, na rua em que me
criei, cresci e de menino me transformei em adulto. Nessa trajetória toda tive
a meu lado sempre um personagem ao mesmo tempo real e fictício. Real, porque
presente a cada minuto e a cada dia de meu ser. E fictício pelo preenchimento
das fantasias de minha imaginação; fictício por ser um gigante idealizado aos
olhos da criança. Um gigante que se tornou tão frágil no tempo da finitude. Tão
frágil e tão medroso com as coisas da eternidade, com futuros que eram mais de
seus temores religiosos, que de sua atuação nesse mundo de Deus.
Eu
era um menino, tão menino, ele um jovem que sustentava pela mão o filho imberbe
ainda, levando-o aqui e acolá. Gostava quando participava com ele de uma
conferência, ouvindo Mário Melo ou escutando com atenção um Agamenon Magalhães
ou outro qualquer de seus agrados. Falas que eu não compreendia direito.
Antevia futuros, talvez, promovendo essa aproximação precoce do filho com a
palavra, com a intelectualidade. Não soube de meus livros, de minha eleição
para a sua Academia, ocupando justamente a cadeira de número 16, que fora a sua.
Não soube também de seus livros, publicados depois que se encantara, in memoriam, como se diz no comum das
coisas. E não soube de seu próprio centenário, assinalado com uma conferência
magistral de uma conterrânea, que escreveu tese sobre si.
É
isso mesmo! Hoje o meu pensamento está assim, dividido, por um lado o meu pai,
encantado já há tanto tempo, vinte anos na contabilidade das ausências, e eu,
pois que sendo pai, hei de almoçar com os meus, vou provar do bacalhau feito
pela filha mais velha, primogênita da prole, mais vou levando a tiracolo a
outras duas e mais a mulher de meus sonhos; de meus sonhos físicos e de meus
sonhos espirituais e humanísticos. Por lá estarão o meu genro, Gonzalo de
prenome e o meu neto, Pablo, El campeón.
A vida é dessa forma, as pessoas vão passando com o tempo, o relógio dos anos
carrega de um por um, deixando claros incríveis e vai trazendo gente que se
acresce à família; gente que faz crescer a chamada constelação parental.
A
saudade é grande, sobretudo do tempo de criança, das idas e vindas ao parque 13
de Maio, das mãos dadas, como se isso nos ligasse definitivamente. Como se isso
desfizesse por antecipação os desentendimentos no campo do social ou na seara
do político. Aquelas mãos de antes ficaram tão velhas e tão marcadas, que eu as
olhei certa vez em derradeira visão, para não esquecer nunca: mãos de um velho.
Agora, vejo as minhas mãos e as comparo com aquelas, não há diferenças. Eu
também estou velho!
Geraldo, Homem de Deus!
ResponderExcluirSua melancolia expressa, nesta postagem, me trasnmite o mesmo sentimento. Olho as minha mãos e me sinto velho, também. E lembro do velho meu pai, que, aliás, morreu moço, com 66 anos. Ele me carregava no mesmo 13 de maio, de macaquinho. Vc foi carregado de macaquinho? Sentado nos valorosos ombros do seu pai? Que saudade!
Feliz dia dos pais, meu amigo!
Girley Brazileiro
O tempo não espera nem perdoa ninguém, pai. As lembranças nos restam e nos fazem reviver. Você vive e revive constantemente, com o mesmo fervor. Isso é dom.
ResponderExcluirUm grande beijo da sua filha.
Bem gostaria de ter assinado essse texto. Claro, sem as especificidades do convívio do autor com Nilo Pereira. Mas, com as do convívio de Silvio Costa com Bôanerges Costa. À falta do seu talento, Geraldo, resta-me levar o pensamento "para o outro lado" e dizer: papai, lí isso aqui e me lembrei de você. Ele vai gostar!
ResponderExcluirFeliz dia dos pais,amigo. Silvio Costa, o da UFPE.
Uma história de amor filial que conta a grandeza da renovação da vida. Todos nós, de forma mais ou menos igual, temos de trilhar essa determinação vital. Vi muito do que conta e do que diz em relação à minha experiência de crescimento junto a meu pai.
ResponderExcluirGera:este seu blog muito me emocionou. Levou-me a tempos idos que só retornam na memória. Que saudade do meu pai. Sua crônica me remeteu a um homem muito calado, posto que muito tímido, mas que marcava sua presença com seu olhar de profunda admiração pela filha, retratado em algumas fotos. Certa vez tive um sonho que andava acompanhada de um lobo Tudo era muito estranho porque sabia ser esse animal selvagem, feroz e com impossibilidade de dominação,porém não sentia medo dele e, ao contrário,me sentia protegida, quando comentei essr sonho com meu pai,ele perguntou se eu não podia imaginar quem aquele lobo representava. Eu, um tanto perplexa por aquela fala indaguei: e por acaso voce sabe? ele numa postura ereta, levantando-se sua cadeira disse: claro que sou eu e ai de quem lhe fizer algum mal, estarei sempre por perto. E até hoje carrego a certeza de uma proteção invisivel, porém presente.Zaina a mulher dos seus sonhos.
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