Em
crônica recente, publicada sob o título de “O tio do boy”, um leitor que não
se identificou, deixou o seguinte comentário: “Geraldo, você sempre foi
chegado a um rolo. Atração fatal, diz título de filme. Se pesquisar todos em
que já se meteu ou vivenciou, melhor dizendo, é coisa pra doze volumes.
Afora os que você, com esse senso de humor arretado, já aprontou com os
"penitentes" da vida. Conte por aqui aquela sua aprontação, que
fez um carroceiro cantar o Hino Nacional no meio da rua, nos chamados
"anos de chumbo". Forte amplexo. em O Tio do Boy” .
Na
realidade, o carroceiro não cantou propriamente o Hino Nacional, mas quase
canta. Foi o seguinte: eu morava defronte de um sindicato; de um sindicato de
pouca representatividade, mas com diretores que se comportavam como se
tivessem engolido um rei, tal o poder com o qual se imaginavam. Não falavam
com ninguém e muito raramente cumprimentavam os vizinhos. Uma gente que
pensava mandar e desmandar para o resto da vida. Andavam com um carro da
instituição e transitavam com esse veiculo acima e abaixo, sem respeitarem
as limitações de um carro assim.
Pois é,
num sábado qualquer dos anos 80, estava eu na calçada, quando vi um dos
diretores solicitar do vigia que lhe abrisse a porta e entrou. Imediatamente
me veio à cabeça a ideia de colocar o homem numa embrulhada, passar-lhe um
trote. Diante do sindicato havia três mastros e habitualmente eram hasteadas
as três bandeiras do hábito. Naquele dia, por falta de expediente, não foram
postas em seu lugar. Mas, me ocorreu ligar e solicitar fossem hasteadas com
pompa e circunstância. Liguei! O diretor atendeu, deu nome e cargo,
facilitando o meu trabalho:
- Meu
senhor, diga-me lá, passei agora mesmo por ai e não vi bandeira alguma nos mastros do sindicato. A que se deve isso?
- Quem
fala?
- Aqui é
o capitão Fragoso!
-
Capitão, o senhor de me desculpe, mas hoje é sábado e não há expediente!
- Ora,
tem graça uma coisa dessa, então o senhor não sabe da nova lei; a lei que
obriga hastear o pavilhão nacional todos os sábados.
-
Realmente, não sabia. Mas, vou imediatamente providenciar para que seja
hasteada, conforme a sua recomendação.
- Não,
meu caro diretor, mas não é assim, há um ritual a ser seguido. Ninguém pode
levantar a bandeira até a ponta do mastro sozinho. O ritual exige a presença
de três pessoas.
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- Mas,
Capitão, compreenda, só temos aqui dois homens!
- Com
dois não pode! O senhor faz o seguinte: chama uma pessoa que for passando e
compõe o ritual. Caso contrário, já sabe, cadeia.
E ia passando um carroceiro, um
trapeiro, puxando a sua carroça e recolhendo o que encontrava pela rua com
possibilidade de ser vendido. Pois ele foi convocado, posto ao lado do mastro e
a bandeira subiu garbosa, com esse pelotão arrumado. O vigia, o diretor e o
trapeiro. E assim eu fiquei vingado da vaidade desse pessoal que julga ter
poder eterno.
Caro Geraldo, o leitor "que não se identificou" foi esse reles escriba aqui, que, meio maluco, "sesqueceu" de "assentar" o nome. Silvio Costa, o da UFPE.
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