Velhos corredores esses, os de minha escola, os da antiga Faculdade de Medicina. Corredores de minha juventude, sacrários dourados da prata da vida, de quem como eu continua sendo um corredor de obstáculos, saltando-os a intervalos incertos de tempo. Há sempre mais um, no dia a dia da gente! Não os posso percorrer - os corredores -, agora, encorpado pela carga da beca e o peso do cargo. Adulto, amadurecido no carbureto da existência, trago o cabelo pintando e o corpo vergando; são as marcas das horas difíceis e o translúcido sinal da responsabilidade vivida. Vivida com a própria vida, mas vivida, também, com sofreguidão, com vidas por outros vividas. Ah, momentos de tanta tensão!
Ando, de um por um, os corredores todos, analisando cada recanto: aqui se fiava conversa e ali, numa tarde morna de abril, um amor restou fiado, em juras que foram desfeitas e promessas nunca cumpridas. Entro e saio das salas de aula como se fora, pelo menos em espírito, aqui e agora, o adolescente, quase, de vinte anos de idade. Faço dessa manhã ensolarada a moldura de minha nostalgia. Há tempo pra tudo, tempo para amar o presente e tempo de querer bem ao passado. Não importa que vá a uma reunião, mais uma, dentre tantas de meu ofício. Dispenso hoje, somente hoje, o direito à palavra e ao aparte, como dispenso a questão de ordem e o dever do voto a cada ponto da pauta. Antes, desejo a democracia de meu interior, deixar o pensamento vagar em devaneios, preenchendo esses etéreos e bucólicos espaços, limitados, simbolicamente limitados, por paredes que aprisionam as minhas saudades. Eis o pranto do silêncio consentido.
A escola é a amante dos tempos de menino, imaginária, às vezes, como tantas outras coisas neste mundo de Deus, mas bela de rosto e bonita de corpo. Inesquecível, mesmo que envelheça a face e quebre o desenho das formas. O amante que se entrega, depois se desintegra, porém a amada fica, no mesmo lugar, impávida, plantada com a força do pinho, assistindo a todos e a tudo em sua volta. Outros amantes chegam e do mesmo jeito, furtivo, se vão! Continuam, à distância, quase sempre, cantarolando-lhe versos de amor, os quais são poemas da saudade. Vez ou outra, como agora, vivem a fantasiosa ilha do reencontro.
Mas, os meus professores, em maioria, estão na tumba, dormem o sono do imponderável. Um ou outro cruza comigo neste caminho do devaneio. Trazem as fisionomias sulcadas, de tantas e tantas lutas no quotidiano da vida. Os funcionários, também, sofreram a estranha metamorfose da existência, envelheceram implacavelmente. Até alguns colegas se foram no éter do desconhecido! Gente nova, ainda, pra entregar ao Criador a alma nascida e criada no dia após dia do sofrimento dos outros.
Corredores repletos, estes, movimentados de gente que vai e vem. São alunos que cumprem a transitoriedade acadêmica da vida universitária ou são mestres de gerações recentes, jovens, dinâmicos e apressados, no permanente mister de transmitir o conhecimento. Corredores repletos, mas vazios para mim! Não circulam mais os professores do meu tempo e não há aquela algazarra conhecida do alunato de tantos anos pra trás.
Velhos corredores, estes, os de minha juventude.
Geraldo,
ResponderExcluirHá sempre um dia em que a saudade bate forte e os nossos devaneios trazem de volta tantos dias vividos e, agora, revividos...
Por vezes, provocam mesmo a tal da melancolia.
Muito boa a sua crônica, no tom que mexe com o leitor, posto que há sempre algo a se identificar.
O importante é saber que o tempo é outro e que o indivíduo, na sua vivência, adquiriu mais segurança e, talvez esteja menos tenso do que aos 20 anos. Isso poupará algum sofrimento advindo da grande saudade.
Parabéns pelo seu texto. Muito bom!!!!
Certamente, agradará a muitos.
Eliana
Passando brevemente pelos corredores dos blogs, estiquei o olho em teus escritos e parei, sorvi os escritos com prazer. Escreves de forma agradável e vou tentar encotrar o teu livro. Parabéns pelo trabalho!
ResponderExcluirSérgio Paiva
Caro Geraldo, parabéns pelo belo texto. Melancólico e comovente. Às vezes a melancólico nos invade sem pedir licença. E como é bom poder viver e reviver esses momentos maravilhosos. Felizes aqueles que ainda podem passear pelos velhos corredores de sua juventude.
ResponderExcluirGrande abraço,
Ormuz Barbalho Simonetti