O menino era endiabrado, fugia de casa
o dia inteirinho e a mãe corria atrás, pedindo ao engraxate da esquina que a
ajudasse na captura do fugitivo infantil. Até que um dia o homem dos sapatos
justificou que seu oficio era outro, diferente daquele, isto é, da captura de
meninos fugidos. Fazia mal às galinhas do terreiro e maltratava os gatos. Curou
o galo que estava com um gogo desgraçado. Aplicou-lhe uma descarga violenta de
ar com uma bomba de encher pneu de bicicleta. E a ave curou! Um dia, comprou um
petardo de São João, prendeu num barbante de boa fibra e amarrou do rabo de um
gato preto; diante do estouro o bichano deu um salto mortal e ainda hoje corre
para se livrar do incômodo.
Havia pras bandas das touceiras de
banana – banana maçã -, um ninho de uma galinha pedrês e a bicha, choca como
estava, corria atrás do primeiro que se aproximasse. Ora, o menino soube por
ouvir dizer que a água tirava o choco e pegando a penosa pelas asas levou-a ao
tanque de lavar roupa. Foi grande a surpresa quando se viu invadido por pixilingas, das
mais agressivas daquele quintal e disso nunca esqueceu. Coçava-se feito bicho
com tapuru da mosca varejeira. Foi preciso um banho com muita água corrente e
álcool para se livrar dos piolhos.
Quando os cupins quase dão conta das
estantes do pai, exultou de alegria, afinal as madeiras foram descartadas no
terreiro. O menino reuniu as bandas das estantes e construiu uma cabana. Era um
barraco armado ali, no terreno de casa. Um dia, já na boquinha da noite, Gelda
passou e ouviu do menino a frase definitiva: “Gelda! Sabe a cor do cavalo
branco de Napoleão?”. E a mulher, inocente de pai e de mãe, disse que não sabia
e entrou para tomar ciência. Resultado descobriu e fez descobrir o amor.
Virginia também entrou por lá e fez a narrativa de seus dias no canavial de
Palmares, onde se perdeu – ou se achou! – num dia com sol a pino.
Maria de Camocim já sabia da fama do
minúsculo cantinho, quando foi conhecer detalhes do barraco. Acomodou-se em
banco da feira de Santo Amaro, trazido na cabeça por “pássaro triste”, e
danou-se a falar. Era daquele lugar quase santo, porque tinha um convento e uma
santa devota, mas resolveu sair a Caruaru com primo de sua confiança e uma
criança habituada a pastorear moça casadoira. Não prestou não, nas imediações
da estação, o primo de nome Maneca, levou-a a uma pensão vagabunda e fez o
serviço. Não sabia, ainda naquele tempo, se o resultado fora ruim ou se fora
uma benção de Deus. Não meta Deus nessa história, dizia o menino contrito,
porque era coroinha e como tal devia se comportar. E muitos anos depois, era o
menino já um adulto e do alto de uma pensão nas imediações do mercado ela
gritou: “Genésio!”. E o homem parou; parou e olhou: “Maria estava grávida de um
trabalhador do porto. E a vida seguiu!”.
E como coroinha ajudou muitas missas
de muitos padres. Passou a vida lembrando do dia em que o sacerdote pediu vinho
pela segunda vez e ele respondeu: “Acabou-se! O senhor está bebendo demais!”.
Não fora assim, o menino derramara na pia da sacristia o máximo que pudera da bebida
quente e amarga. O sacerdote com raiva nunca mais quis o coroinha em suas
missas. O menino tinha uma fantasia e com ela dormia, imaginava as moças da
igreja dirigindo-se para a comunhão com os seios à mostra e assim ajoelhadas.
Era o cúmulo do sacrilégio dissera o padre confessor ao saber do quanto o
imaginário do menino viajava em mares revoltos.
O menino tinha essa mania; uma mania
de ver e tocar nos seios alheios. Fazia uma verdadeira ronda pela vizinhança,
olhando as meninas mudarem de roupa. Um dia, viu a mãe de um amigo nua da
cintura pra cima. Olhou e fixou a imagem, para depois arrepender-se do ato. E o
confessor quase não perdoa tamanha afoiteza. As de sua idade já está de bom
tamanho, mas às velhas o respeito que merecem.
Andava nas ruas da cidade a uma velocidade que hoje não poderia repetir
e tocava, como se fosse sem querer, nos bustos que podia. Contava esse esforço
nos dedos das mãos: 10 a 12 seios!
Um menino peralta, dizia a tia que não costumava usar sutien e nem cacinha.
Menino encapetado da gota-serena. Veio-me à mente a possibilidade de identificar a personagem, mas deixa pra lá... Depois de todas as estripolias, - fujão, curador de choco de galinha e montador de arapuca de comer gente - achou pouco e tornou-se um papa-peito. Encarnação do tinhoso! Silvio Costa, o autor de "Uma vez...".
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