Na perspectiva das mudanças todas que o mundo experimenta e
dos danos que já está trazendo no campo social, há o risco que poderá trazer à
cultura e às artes. Imagine o leitor as consequências da veiculação da produção
intelectual de países desenvolvidos no combalido Terceiro Mundo, tão
desprovido, já, de recursos no campo do humanismo! Se as coisas partissem dos
berços que forjaram a civilização e permitissem o conhecimento das obras
clássicas, por exemplo, no campo da literatura e da música, como da pintura e
da escultura, por certo, os ganhos estariam garantidos! Mas, se a importação
cultural predominar, como se pode esperar, na ótica de países diferentes,
novos, embora postos no patamar dos desenvolvidos, numa tentativa de difundir o
que se chama de pop e outras denominações do inteiramente
estilizado, vai ser o caos! Globalização, entretanto, não deve ser sinônimo de
uniformização e não é preciso, pois, perder a identidade para partilhar da
pós-modernidade!
As inúmeras antenas parabólicas no interior de Pernambuco
representam, ao que parece, uma antecipação do processo de mundialização da
cultura, uma uniformização nacional, já, em tudo não desejável, haja vista as
diferenças significativas entre as regiões do Brasil. Ora, dia desses, em
cidade do Agreste, distante três horas, se muito, do Recife, ouvi uma indagação
a propósito da Capital e à minha resposta, o interlocutor de ocasião
desculpou-se: "Não assisto mais os canais locais!". E não se assiste,
mesmo! Antes, o receptor das casas interioranas e do nosso mais do que belo
arquipélago de Fernando de Noronha captam sinais de outros estados, quando não
transmissões alienígenas! Dessa forma; podem manter contacto com o resto do
mundo e ignoram os acontecimentos próximos! Lembra um pouco os tempos do antes,
de uma censura velada às emissoras de rádio e de televisão, quando se procurava
a sintonia estrangeira para se ter o noticiário negado na prática. A diferença
do hoje é o estado democrático em que se vive, se pensa e se escreve, até! E
mais fácil, então, admirar o samba e a música da Bahia ou o Boi do Pará, que o
Frevo de Bloco!
Certas manifestações folclóricas, mesmo que herdadas da
colonização, como as quadrilhas de São João, que encantaram a vida de tantos e
serviram para o encontro de muitos, surgem na telinha da forma mais estilizada
possível, com ritmos diferentes e roupas adaptadas ao tempo da metamorfose! O
Carnaval fora de época, também, chega como se fosse a indústria da baixa
estação, enche a Av. Boa Viagem de trios elétricos, que tocam, da maneira mais
ensurdecedora que já se viu no Recife, acima de todos os decibéis suportáveis,
músicas que fazem sucesso em Salvador. Há, por trás de tudo isso, um esquema
comercial de fazer inveja a qualquer negociante da cidade, com a indumentária
nomeada por estranho vocábulo - "Abada" -, sendo vendida a prestação
e representando a senha para a entrada no respectivo trio. E a rapaziada
compra, se compromete e paga, depois desfila ali, entre os seguidores do
"Recifolia". O "Axé Music", que mistura um pouco de tudo,
faz sucesso, pois, na capital do forró e desbanca a sonoridade melodiosa de
Nelson e de Capiba, pelo menos por uns dias!
Ora, nestas paragens em que pontificou e pontifica gente da
melhor estirpe, entre escritores e poetas, os quais cantaram a beleza dos rios
e a grandiosidade das terras, além dos amores e das dores, em prosa e verso ou
nestas paragens de compositores e de pintores, de produtores da sétima arte,
premiados, sempre, não se pode apagar a chama do inteiramente humano! É
necessário, sobretudo, estimular a criação, fazer como, recentemente, fizeram a
Prefeitura da Cidade do Recife, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e o
Colégio Contato, de cuja junção de forças nasceram três prêmios, também, para o
cinema pernambucano. Ou é preciso fazer como acaba de propor a Companhia
Editora de Pernambuco à UFPE, a reedição de um volume no qual estão as
principais riquezas do folclore, à semelhança da iniciativa anterior, do Voz
Poética, um conjunto no qual estão Ascenso e Manuel Bandeira, Cardozo e Mauro
Mota, Gilberto e João Cabral, além de Olegário Mariano, declamando amores. E os
cantadores populares, repentistas do mote, que nas feiras improvisavam o verso?
Estão sucumbindo à força das novidades do tempo!
É necessário, também, resgatar as velhas estórias contadas
pelas nossas avós, substituídas - que pena! -, pelos desenhos animados e as
cantigas de ninar, que embalavam as crianças de colo, no entoar de loas assim:
"Geraldo vá dormir/Que eu tenho o que fazer/Vou lavar/Vou engomar/A roupinha
pra você/Esse menino não é meu/Me deram pra eu criar/Obrigação de quem cria/É
menino acalentar".
Um texto de meu recente livro - Textos esparsos, crônicas dispersas -, escrito há muitos anos e guardado por minha mãe, que cuidou em arquivar tudo, dando-me de presente uma quantidade grande de crônicas e de artigos, os quais pude reunir em volume que lancei faz menos de um mês.
Um texto de meu recente livro - Textos esparsos, crônicas dispersas -, escrito há muitos anos e guardado por minha mãe, que cuidou em arquivar tudo, dando-me de presente uma quantidade grande de crônicas e de artigos, os quais pude reunir em volume que lancei faz menos de um mês.
Caro Geraldo:
ResponderExcluirComungo com você desse "desalento" que dá quando vemos as nossas tradições relegadas a outro plano. Quase esquecidas. A globalização é ótima para se trocar conhecimentos, se aprender e também mostrar o que temos. Infelizmente, estão aderindo aos outros ritmos e culturas como se fosse, a nossa, uma "coisa" sem valor, mas acredito que só os incultos, compram com maior prazer o produto de fora. Sou uma apaixonada por nossa cultura e nosso ritmo e costumo dizer: - Pernambuco, o meu sangue freva por você! (sou paulista de Tupã, mas pernambucana de sangue e coração). Obrigada, por mais essa beleza.
Um abraço,
Lígia Beltrão - Colunista Divulga Escritor, Cálice Literário (Mosqueteiras Literárias) e Facebook