sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Deixe a sua Mensagem

Quando contratei os serviços de uma secretária eletrônica, francamente, não pensei que fosse desgostar da minha própria mensagem, verbalizada assim, na rotina das ausências: “No momento, não podemos atender! Após o Bip, deixe a sua mensagem! Obrigado!”. Isso era rotineiro demais para mim, cujo imaginário vive nos ares do mundo e dessa forma terminei adotando uma sistemática diferente, a de fazer a troca da comunicação dessas impossibilidades a cada semana. Tenho cumprido o desiderato das dificuldades com os meus interlocutores de ocasião da melhor forma possível, modificando o teor das minhas palavras, na sexta-feira sempre, chova ou faça sol! É verdade que vez por outra aparece uma pessoa que reage ao inusitado da resposta, mas, no geral, a variedade vem agradando aos ouvintes, incomodados com a linha ocupada ou com a casa fechada. É necessário falar muito rapidamente, engolir vocábulos, tão pequena é a memória dessa virtualidade moderna, que Graham Bell não viu e não ouviu! E nem Dom Pedro II, um apaixonado pelo telefone, como era! A TELPE deveria, inclusive, premiar as melhores mensagens!

Numa dessas, quando da aproximação do Dia de Finados, dizia: “Na proximidade dos finados, lembrai-vos do desiderato bíblico: E ao pó voltarás!”. Uma moça, que imagino tenha ligado enganada, ao ouvir o que estava gravado, não teve dúvidas e disse em troca: “Babaca!”. Mudei, de pronto, o texto e o redigi antes de falar, pra não cair na tentação de outras coisas assim, ligadas às finitudes da existência humana. E gravei o seguinte: "Nas proximidades dos Finados, não esqueça dos velhos monges de Olinda, que nos silentes corredores dos antigos mosteiros, cumprimentavam-se assim: ‘Lembrai-vos da morte!’ Deixe a sua mensagem! Muito obrigado!". Foi um sucesso a reação, gargalhadas largas e risos contidos. Algumas palavras de reprovação e até de ironia, como aquela da interlocutora de ocasião, numa ligação errada, por certo: "É doido!". Devo fazer, agora, uma pesquisa sobre o padre que tem um pouco de ator, também: “Deixe a sua mensagem e a sua opinião sobre o Padre Marcelo Rossi! Obrigado!”.

Quando de uma certa viagem à França, fiz questão de prevenir à minúscula largueza dos meus convívios: “Informo que fui a Paris, visitar minha filha, Fabiana de prenome, que por lá cumpre estágio!” Alguns dos meus amigos, todavia, chamaram atenção para a possibilidade de estimular os ladrões do chamado entorno, com o aviso de um pai fora de casa, no meio do Velho Mundo, resgatando afetos e afagos junto ao rebento que do rebanho desgarrou-se, temporariamente, parece – só parece, entretanto! Na verdade, os gatunos daqui não gorjeiam como lá, pois que os conheço e já os dominei com a arte de fiar conversa e não creio, firmemente, na desforra. Sobre a globalização já deixei, igualmente, umas palavras: “Na perplexidade do tempo, a globalização brutaliza o homem! Deixe a sua mensagem! Obrigado!” Sobre a violência, também: “Na causalidade da violência está o desprezo da criatura pelo semelhante!” Aconteceu, certa vez, que uma ligação de pessoa muito piedosa foi atendida por mensagem, em tudo, religiosa, aquela verbalizada em Latim – Dominus Vobiscum – e a resposta ficou na memória: Amem.

Há gente que julga ter errado a ligação e estar, na verdade, falando com a residência episcopal ou quem considere o recado uma maluquice de quem não regula bem, mas a intenção é, apenas, a de promover uma certa variação e não ficar na rotina, naquilo que todos dizem, habitualmente. Guardei por aqui duas das respostas à indagação a respeito do padre Marcelo Rossi, já, ambas favoráveis ao novo ator global, cantor das multidões. Mas, vou juntar o que puder e pedir aos meus colegas dos cálculos estatísticos um resultado adequado e somente assim trarei ao leitor. Deixe a sua mensagem! Obrigado!


Texto escrito há coisa de dez anos atrás, quando usava a secretária eletrônica do telefone convencional e o equipamento portátil estava surgindo no mercado. As minhas filhas eram adolescentes e as mensagens faziam grande sucesso entre as colegas e amigas, a ponto de ligarem pedindo antes para que ninguém atendesse à chamada.

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