terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Ainda a Festa da Mocidade


Quando chegava o fim de ano, instalava-se no Parque 13 de maio a Festa da Mocidade. O meu pai recebia um permanente familiar, significava dizer que podiam entrar todos da constelação parental. Mas eu levava comigo muito mais do que isso, porque me juntava aos amigos e aos colegas e com eles ultrapassava o portão. Uma vez ou outra o porteiro indagava: “Quem são esses?”. E se conformava com a resposta, mesmo que não acreditasse: “São os meus primos e as minhas primas!”. E com esse primado todo curtia a festa. Havia tudo que era brinquedo: roda-gigante, tira-prosa, polvo e carrossel. Sem falar nos carros elétricos, que custavam caro, mas seduziam a molecada.

Havia uma recomendação paterna que não se podia atender, a de não frequentar o teatro, porque ele protestava, quase que diariamente, através do jornal contra a indecência e a corrupção dos costumes. Pois era ao teatro que íamos de logo. Certa vez, no “sereno” da peça “Tem bububu no bobobó”, encontrei um tarado que me falou da investida que sofrera a sua irmã por parte de um colega seu de perversão. Não respeitaram nem a irmã do tarado, foi o comentário final. Mas, do lado de fora da casa de espetáculos via-se tudo e ainda havia a possibilidade de se olhar os camarins. Ora, em determinada noite, estava um dos colegas posto na condição temporária de voyeur, quando um soldado da radiopatrulha segurou-o pela gola. E ele, sem atentar para a hora, disse: “Ainda é minha vez!”. Quase sai dali para o xilindró.

Engraçado foi daquela vez em que o meu pai, depois de ter ganho um sapato rainha, negou-se peremptoriamente a usar. Ele achava que um sapato de pano não lhe era apropriado. Talvez nem fosse! Me deu o calçado e eu imediatamente o calcei e parti para o passeio a dois, quer dizer com a namorada, na Festa da Mocidade. Ali, sentei-me com ela e o sobrinho dela numa mureta da fonte d’água. Quando estávamos relaxados e a conversa fluía solta, histórias fiadas e muito bem contadas por mim, o rádio da Festa anuncia: “Atenção! Atenção Geraldo Pereira, volte para casa, pois seu pai precisa sair com o sapato!”. Foi um horror, porque levantei assim que o meu nome foi verbalizado, motivo para que todos tenham notado o meu constrangimento e depois quase não consigo explicar que se tratava de uma brincadeira.

Andando pelas alamedas iluminadas tinha-se de tudo. O jogo de azar imperava e os menores eram proibidos de apostar, mas apostavam. Fazia-se uma fezinha aqui e outra ali. Barracas de bebidas, também, não se permitiam atender à gente ainda imberbe, mas atendiam. Vez ou outra uma dose de Cinzano, quando não de Martini. O cabo Marcha lenta comandava o policiamento local e andava remando, tal a compleição física. Havia, todavia, o Dono da rua do Imperador, também conhecido como General da Cavalaria Submarina, um maluco que usava dezenas de medalhas sobre uma farda que misturava as três forças de uma vez. E eu nunca dispensei uma galhofa com o homem, dizendo-lhe que me considerava à sua disposição para uma intervenção qualquer. Fosse onde fosse! E por ai a gente fazia de um limão uma limonada.     
Na Noite de Natal, já expliquei e bem explicado, comparecíamos à Missa do Galo na igreja de Fátima. Rezar, raramente rezávamos, mas acariciávamos as cabeças cobertas por véus tão alvos quanto a pureza do lírio. Ou cochichávamos a cerimônia toda, sem darmos brecha a quem desejasse interromper o balbuciar das palavras finamente escolhidas. E o peru aguardava para ser degustado com guaraná Fratelli Vita.