quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O Soldado e o Capitão

Eu era jovem, muito jovem, voltava de uma festa na praia de Pau Amarelo e quando passava pela cidade de Olinda notei que o trânsito estava obstruído, havia uns cavaletes fechando a passagem. Era Carnaval e os festejos da cidade tomavam corpo. No carro vinha minha mãe, que diante do obstáculo ficou muito impaciente, dizendo que não estava aguentando, disposta até a descer e tomar um outro rumo. Eu não tive dúvidas, com a cabeça fora do automóvel chamei o soldado e disse: “Amigo! Eu sou o capitão Marques do Corpo de Bombeiros! Por favor, tire esse cavalete que eu vou passar!” A resposta veio rápida: “Pois não, senhor!”. E foi tirando o cavalete. De repente o sargento grita de lá: “O que é isso?” E o soldado: “É o capitão Marques do bombeiro! Ele vai passar”. Ainda ouvi o sargento confirmar a permissão e bater continência. E eu passei numa boa. Eu, minha mãe e minhas filhas, graças a uma vinculação que nunca tive com o hoje chamado Corpo de Bombeiros Militares, embora tenha tido grandes amigos por lá.


De outra feita, era também Carnaval e eu voltava do Galo da Madrugada com minha mulher. Devia ser entre 15 e 16 horas do sábado de Zé Pereira, como se chama no Recife. Tomei o carro e desejando cortar caminho entrei numa contramão. Nisso, ouço o apito estridente do guarda chamando e gritando: “Contramão! Contramão! O senhor pensa que vai pra onde?”. E eu na maior cara de pau: “Amigo! A autoridade aqui é você, não há dúvidas disso! Mas, eu sou o capitão Marques do Corpo de Bombeiros! Gostaria de prosseguir e de sair dessa embrulhada”. A situação mudou completamente e ele me pediu por tudo que continuasse em frente, isto é vencesse a contramão sem o mínimo pudor. Foi o que fiz! Hoje não faria mais uma dessa, porque o tempo passa e não se tem mais coragem de fazer presepadas assim.


Numa ocasião, vinha pela rua Bernardo Guimarães, aquela que passa atrás da Universidade Católica. Dirigia o meu fusca 65, o primeiro que tive. Havia um soldado do Exército sentado no meio-fio, conversando animado com uma doméstica. Não hesitei, chamei-o as ordens: “Soldado! O que faz ai a essas horas?”. E ele, dando continência: “Eu já estava indo para o quartel. O senhor me desculpe!”. Insisti com a bronca e sentenciei: “Passo por aqui dentro de mais alguns instantes, se estiver ai, será recolhido!”. Sim senhor, respondeu e desapareceu do lugar, com ele também as esperanças de Maria. Essa coisa de soldado do Exército, contava meu pai que em Natal, à época da guerra, o general costumava andar pelas ruas em trajes civis. Numa noite, passeando pelo centro da cidade, decidiu voltar e pediu carona a um jipe que passava. O soldado levou o senhor na maior, mas quando indagado sobre o que achava do general, foi incisivo: “Um chato! Um camarada cheio de vontade. É invenção sobre invenção!”. Na porta do quartel o motorista disse: “Agora eu fico! E o senhor desce!”. E o general: “Eu continuo! Sou o general!”. Não precisa dizer que o recruta quase cai de costas.


Quando os primeiros casos de Dengue foram diagnosticados no Brasil, houve uma mobilização geral das repartições de saúde para a nova doença que ia chegando e eu fui indicado para uma Comissão de Dengue. Adotamos a linha de educar os profissionais médicos, para que se preparassem para o enfrentamento da virose que ia chegando. Eu fui fazer uma palestra no Quartel General. Cheguei, olhei da porta e sem hesitar entrei, um sargento que portava uma metralhadora veio correndo atrás de mim gritando: “Onde vai?”. Eu ai parei, me voltei pra ele e respondi: “Eu ia! Mas, o senhor grita tanto que eu não vou mais. O senhor avisa ao General que eu vim fazer a palestra e voltei diante de sua gritaria.”. O homem quase endoidece com minha decisão de voltar e só não se ajoelhou pedindo que entrasse porque eu lhe disse da brincadeira.


E por ai vai!