domingo, 19 de outubro de 2014

O meu tempo e os novos tempos

Eu não tinha feito ainda 70 anos de idade, como recentemente aconteceu (4 de outubro) e só agora estou refletindo sobre essa nova condição etária. Quando era mais novo, confesso, nunca parei para pensar na minha sétima década de vida, nunca. O ser humano não pensa nisso, vai vivendo, vai vivendo e quando menos espera a idade avança ou a idade chega. Nos anos da infância não havia tempo para imaginar esse futuro tão distante. As brincadeiras e os deveres ocupavam as horas todas. E na juventude também não, porque o ofício tomava conta dos dias, era um vaivém danado e a cabeça tinha que se dedicar à família, aos estudos de atualização e aos caprichos das injúrias orgânicas.

Ontem voltava para casa com minha mulher e conversávamos sobre as mudanças todas do mundo. Tudo mudou, disse ela, referindo-se ao que vimos de transformação nesse mundo de meu Deus. Saíamos de uma padaria, onde tínhamos feito um lanche, a título de ceia. Isso não havia no Recife do antes e hoje está disseminado, com casas especializadas espalhadas pelos bairros residenciais e também nas cercanias do comércio. E os bancos? Deixaram a condição anterior de estabelecimentos personalizados para se tornarem comunitários. Hoje, as máquinas assumiram as funções dos antigos bancários, que estão resumidos nos interiores das agências a consultores e captadores financeiros.  

Foi ela quem lembrou outra mudança nos hábitos e nos costumes da cidade: o tipo de moradia. Agora, mora-se em apartamentos, conjuntos habitacionais que juntam de uma só vez, quase cinquenta famílias. Mas, não existe mais quintal ou não se brinca nas ruas, como sucedia outrora. Até a geração de minhas filhas isso era possível, porém o tempo e a violência mudaram esse comportamento. Não se pode mais! E o extraordinário desenvolvimento da técnica, em todos os sentidos. Eu, por exemplo, fui operado da coluna pelas mãos maviosas do Dr. Geraldo Sá Carneiro – o Dr. Geraldinho – e duas hastes de titânio foram postas em minhas costas e eu estou andando e bulindo da melhor forma. Hei de comemorar os 10 anos de operado a 4 de maio!

É! A expectativa de vida aumentou! Gente como eu já poderia ter morrido, se a técnica não tivesse alcançado o ponto que alcançou. Os exames estão cada vez mais sofisticados; as tomografias e as ressonâncias têm acesso a tudo e mais um pouco. A Tomografia por Emissão de Pósitrons (o Pet Scan) revolucionou a oncologia e hoje se pode muito bem, não apenas diagnosticar, como também fazer o estadiamento do tumor. Os meus cadernos do último ano de medicina não servem mais pra nada, estão defasados, desatualizados. Nada se aplica mais!

Imagine o leitor como ficará um doente do estômago hoje, depois da invenção da endoscopia. Não fará mais a radiografia do órgão, uma seriografia, como se dizia antes. E ninguém terá mais o trabalho de identificar uma úlcera a partir da imagem de uma chama de vela. Nem vela se usa mais! E os stents cardíacos, que permitem uma sobrevida que não se tinha no passado, mesmo com as pontes?