domingo, 10 de janeiro de 2010

Paletó e Gravata ou Saia Godê


Tenho caminhado no Parque da Jaqueira, na flauta, sem contar quilômetros e sem contabilizar o tempo. Quando me perguntam em casa: “Quantos quilômetros?”. Costumo sempre responder: “O meu personal trainer proíbe essa revelação!”. Conversa fiada! Não tenho ninguém me incomodando o processo de andar e voltar para o recesso do lar, como cabe fazer um quase aposentado, pois que dispensado da atividade de magistério, estou muito bem obrigado no Conselho de Cultura. Mas, ninguém imagine que ando sem prestar atenção aos circunstantes, meus companheiros de pista; uns correndo desadorados e outros a passos mais lentos. Faço o que me sugeriu certo vizinho de Aldeia: uma observação participante. Fosse mais novo, confesso, prepararia uma tese: “As conversas durante o esforço do andar!”. Ou "Fofocas e fiascos na pista do parque".

Abriria o meu ensaio com um relato interessante. É que à saída, nos bancos entre a banca de revistas e a barraca de coco, há sempre gente sentada fiando conversa. Mas dias desses foi diferente, levantou-se uma suplicante muito jovem, bem parecida e bem feita, bonita,diria, porque nem gorda e nem magra, mas na medida boa das coisas e das linhas femininas recomendadas no hoje do tempo. Pediu o coco gelado e enquanto esperava ligou o telefone: “Você vem?” Não ouvi a resposta, claro, mas imaginei: “Estou atrasado, mas chego!”. E a interlocutora, a quem podia ouvir, foi breve: “Venha logo, se não vier, ele sai do trabalho e me procura!”. Ora, estava mais do que claro; era uma “gaia”, para usar a expressão da galera. Tomou a água da fruta cuja origem se discute, e saiu correndo. Acompanhei com os olhos, mas não pude identificar quem dirigia o veículo que a levou. Ignoro o destino, sei do fato, mas não sei do feito.
Nas alamedas do parque, não é difícil escutar assuntos os mais diversos e ouvir temas variados. A última que pude anotar em meus alfarrábios mentais, foi a indagação da jovem mulher de ancas protuberantes a seu companheiro, talvez o cônjuge: “Marcou o hotel?” E ele: “Não não marquei!”. Explicou, então, ao parceiro a beleza do Hotel Enseada dos Corais, desde o atendimento e a recepção aos quartos, aos restaurantes e ao mar; sobretudo o mar, pela limpidez das águas e pela possibilidade de um passeio de barco, parando em lugares privilegiados e degustando camarões e outros acepipes do lugar. Um paraíso, disse! E a resposta foi seca, dura: “Não! Não quero!”. Deu até pena! Não intervi, porque deixei de indagar de meu vizinho que comportamento devo adotar diante desse sentimento.

Duas senhoras ainda jovens passeavam juntas. Uma dessas, loura de cabelos bem tingidos, dizia à outra, negra de pixaim encaracolado, desses que são transformados em tranças bem cuidadas e às vezes mal lavadas: “Me comuniquei com ele durante 20 anos!”. Depois, acrescentou novas palavras, elucidando melhor o caso: “Quando ele arranjou a segunda esposa, desisti! Ele ainda ligou para mim e disse: 'Mariana: Que pena! Uma amizade de 20 anos e nada! Não nos juntamos!'”. Ora, comentava, antes de se distanciar: “Foi demais! 20 anos!”. E a amiga, admirada, dava a sua opinião, optando pela rejeição, também, daquele candidato a marido que por duas décadas hesitara em relação às escovas juntas e aos trecos reunidos. Paciência, concluiu! Perdeu tempo!
Há figuras exóticas para o lugar. Gente andando de roupa mais adequada aos afazeres do trabalho, de calças e camisas de mangas compridas ou mulheres de saia godê – godê? – e blusa de seda. Dia desse, à saída, tive a impressão – só impressão – de que um senhor de paletó e gravata ia entrar no parque e andar na pista. Valha-me Deus do céu!