quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Jia, Ovelha e Pluto.

Na manhã de 8 de dezembro, nos 40 anos exatos da formatura, alguém poderia ter dito, como Carlos Drummond de Andrade: “E agora, José?/A festa acabou,/A luz apagou,/O povo sumiu,/A noite esfriou,/E agora, José?/E agora, você?”. Dessa forma, quase repetiria a paródia do verso, distribuída em 1968 pelo laboratório Carlo Erba, com o prenome do personagem substituído por doutor: “E agora doutor?/A festa acabou/...”. Ninguém disse, porque de nada serviria repetir terminalidades. Antes, todos se reuniram no pequeno auditório para uma retrospectiva dos anos. Assim, o velho relógio foi marcando, com uma foto após a outra, a passagem das quatro bem contadas décadas. Todos gostaram do encontro, e disso reclamação não houve, senão a de Ricardo Fofa – Richard Fofa –, insatisfeito com a carta de vinhos, pois que se acostumou com bebidas finíssimas, por mais de R$ 500,00 a garrafa. Valha-me Deus!
Tudo começou com a celebração levada a efeito pelo padre Francisco Caetano Pereira, interessante figura do clero local, conhecedor de Aristóteles e de Voltaire. Homem versado nos segredos da filosofia e nos meandros da teologia. Falou dos sonhos que preencheram a juventude e da realização de todos ou de quase todos no hoje dos dias. E disse do tempo que se esvai com a passagem do presente; presente, aliás, que precisa ser vivido intensamente, sem dispensar o passado e sem desconsiderar o futuro, que a Deus pertence. Não deixou escapar a pitada graciosa e ao mesmo tempo irônica, das esperas nos consultórios médicos, sobretudo se o atendimento for por ordem de chegada. E é isso mesmo! Ali, naquela sala transformada em templo, de mãos dadas, os maduros concluintes de quarenta anos atrás rezaram aos céus, pedindo paz e amor, como faziam os antigos hippies.
Alguém tomou um velho papel, carcomido pelos anos, e pediu a cada um dos presentes que assinasse, indicasse o apelido e registrasse o endereço eletrônico. Talvez com isso tenha repetido o gesto dos professores de outrora, aos quais nunca se deu o direito de conhecer os jeitos modernos da informática. Baré, de todas as distâncias amazônicas abriu a lista e vieram os demais: Cláudio Catarro e Silvio Histologia, Jacaré e Espantalho, Hepatite e Estrelinha. Mas, quando se pediu o nome e o cognome de Marcelo Macaco, Jia, de pronto, intercedeu, pedindo fosse modificado o apelido para Mico Leão Dourado, haja vista o alvo da cabeleira e o branco do bigode. E assim foi! Pluto se fez presente e acompanhado de Ovelha, de Pato Feio e de Bochecha quase entoam um cântico de despedida, não fosse a ação imediata de Jia, que abriu a boca de batráquio bem criado e deixou nos ares a voz anfíbia das melosas cantigas do passado.
Ataíde, cujo apelido mais forte era hepatite, foi conhecido, também, como ataúde. Homem de uma memória prodigiosa, capaz de resgatar grande parte do discurso de paraninfo do mestre Zappalá, saiu-se com essa:

Marcos (Espantalho), ao tempo de estudante, tinha pouco dinheiro no bolso e por isso, não hesitou em fechar o rombo no sapato com um esparadrapo, cobrindo o remendo com a conhecida tinta Tic-Tac. Vai entrando no clube com a namorada Nina e de súbito pisa numa ponta de cigarro. Dá um salto se defendendo da queimadura e quase não espera a pergunta:
- O que foi isso?
Mas, responde prontamente:
- Muita animação para entrar no salão.
E a festa prosseguiu com Jia se transformando em parasita de Ovelha. Não largava o ovino por nada nesse mundo. Foi a primeira vez que um batráquio passou a viver dependente de um ovino.

E a mulher de Pluto, que cachorra não é, diante de tanta brincadeira e de tanta alegria, expressou o seu pensamento: “É muita vida!”.



(*) - Primeira de algumas crônicas que pretendo escrever, depois da festa dos 40 anos de formado. Experiências do hoje das coisas e histórias do ontem do tempo. O pitoresco dessas passagens, na palavra de velhos companheiros dos bancos de Universidade. Comente, se desejar, para pereira.gj@gmail.com ou para pereira@elogica.com.br Se nao quiser, nada escreva e nada diga. Mas, leia!