sexta-feira, 24 de julho de 2009

Ciência e Fé

O momento de agora, de um amanhecer preguiçoso nos domínios de Aldeia, com a chuva compondo a paisagem de uma quase meia-luz e o frio garantindo o aconchego necessário à reflexão, dedico-me à leitura de um livro especial: "Quando a Ciência Encontra a Religião". Talvez o autor – Ian G. Barbour – realize uma tentativa de resgate de minha fé, tão frágil como é. Ele próprio um entusiasta dessas aproximações modernas entre o fato científico e as posturas religiosas, mais flexíveis e menos rigorosas. Profundo estudioso das relações entre a fenomenologia carregada de ocorrências não explicadas pelos postulados naturais e um Deus que não precisa ser mágico ou bruxo, antes um espírito de absoluta completude, que usa as leis da natureza para criar.
Barbour mostra o quanto as relações entre a ciência e a religião foram variadas. No século XVII mostraram-se amistosas, já que a revolução científica foi obra de estudiosos que eram cristãos devotos. Mas, relações hostis nos anos 1800, em que pese o reconhecimento de Darwin a propósito da interveniência divina na evolução, mesmo considerando essa participação no enfoque do geral e menos no detalhamento dos passos. No século XX, entretanto, buscou-se uma interação maior entre a ciência e a fé. Por certo, a maior flexibilidade da Igreja, a partir de João XXIII, influenciou a desejada proximidade. E neste milênio que ainda emerge, há uma inclinação nítida a um intercâmbio cada vez maior entre cientistas e teólogos. Queira Deus não venha o cardeal alemão atrapalhar!
Tudo porque determinados fenômenos não se explicam pelas leis conhecidas. Exemplo disso é o Big-bang, a grande explosão do universo primitivo, a partir de uma minúscula bola, resultando na enormidade do macrocosmo. Os postulados da física não justificam essa fenomenologia original e só a intervenção de uma força maior, suficientemente capaz de ultrapassar o natural das coisas, pode justificar a gênese. De outra parte, se a física clássica é reducionista e determinista, sobretudo quando propõe que o comportamento de cada objeto resulta do conhecimento preciso de seus componentes, a física quântica admite a incerteza intrínseca, demonstrando a impossibilidade de previsão dos eventos a níveis atômicos e subatômicos. E a física quântica nega a possibilidade das reações de um objeto resultar da soma das partes, sem contemplar as leis do sistema.
Já na questão da evolução, fruto da observação e das reflexões de Darwin, parece possível crer, firmemente, no processo de aperfeiçoamento das espécies e no surgimento de novos seres, desde as formas mais rudimentares de vida ao homem, sem se afastar da idéia de Deus e das crenças religiosas. É medieval a posição estática em relação ao Universo e há uma tendência moderna por parte dos teólogos em aceitar uma postura dinâmica da criação continua e de um Deus que é imanente à natureza e que também transcende. No século IV, inclusive, como refere Barbour, Santo Agostinho fez um comentário a propósito dos choques registrados entre a interpretação literal da Bíblia e o conhecimento provado, recomendando, em caso de conflito, uma interpretação metafórica do livro sagrado.
Deus permita que os homens de boa vontade reconheçam a transcendental existência e abandonem o mundano das coisas e a tão freqüente teologia do sucesso.





(*) - Crônica de minhas tentativas de retorno ao seio da religião católica, depois de anos e mais anos afastado. Comente: pereira@elogica.com.br ou pereira.gj@gj@gmail.com