sexta-feira, 18 de março de 2011

A Saudade

O dia hoje é de despedida! O netinho volta para o frio de Madri! Deixa o calor dos trópicos pra trás e vai se agasalhar até não poder mais nas distâncias de Espanha, onde, pelo que soube, fez 3°C nos últimos dias. Um horror, para quem como eu vive em terras de sol a pino. Segue em boa hora, porque vem por ai o equinócio, é o que se diz, com temperaturas altas, acima de 36°C e sensação térmica de 40°C, é a febre do universo. Mas, deu muita graça por aqui, desarrumou a casa toda, recolheu, ninguém sabe pra onde, as canetas de minha cabeceira. E soube arranhar os CDs de uma coleção feita ao longo de muitos anos. E muita coisa mais! Repetiu as minhas filhas nos começos da vida.

Fez com a avó uma ligação especial. Deitou e rolou! Lá por Aldeia armou acampamento e foi ver de perto a coleção de “Branca de Neve e os Sete Anões”, que o vizinho mantém em seu jardim. Beijou a todos, na santa inocência dos infantes. Chama bonecas de “Queca”, dando o masculino para os bonecos. Os viu em quantidade, mas encantou-se mesmo com a decoração do Carnaval, chegando a expressar, no seu português espanholado: “Queca, Queca, que lindo vovó”. Dançou o frevo e ensaiou o Maracatu, fez da rua uma passarela de seus mimos. Sai daqui falando mais em português que em espanhol, mas quando chegar por lá, na Península Ibérica, volta ao palavreado próprio do castelhano bem falado.

Descobriu por cá a pipoca das barracas e quando descortina uma dessas armações improvisadas, diz de logo: “Coca, mamãe!”. E a genitora, primogênita da casa, já não sabe mais o que fazer com esse pedido desajeitado. Toma seu leite regularmente, numa mamadeira bem cuidada, sabendo pedir o produto de forma peculiar: “Leite com tatai!”. Descobriu, porém, um achocolatado de multinacional do leite e dele não se desgrudou mais. Quando deseja o produto pronuncia na sua linguagem peculiar: “Uco de cocoa”. Isto é, como vem no rótulo a imagem de uma tartaruga, ele verbaliza que deseja suco de tartaruga. Só aqui por casa se toma suco assim, tão diferente e tão especial.

As outras filhas, tias do bebê, receberam um trato especial de Pablo: “Tia Dinda”, a madrinha e “Tia Aol”, também madrinha, mesmo com a reação do Padre Caetano, que batizou o menino na Igreja da Piedade e não queria repetir a tradição do Monsenhor Francisco Sales, Camareiro Papal. E o neném é visto, vez ou outra, cantarolando sozinho, inventando cantoria com as tias, a avó, de seus afetos, e o “vôvô”, com o bico de quem deseja dar ênfase à palavra. Veja só o leitor. Por aqui se diz que minha mulher – a avó –, costuma andar com as fotos do neto e por onde chega o povo já sabe: “Lá vem a mulher do álbum!”. Numa festa que fomos, dizem minhas filhas, em tom de blague, a qualquer cumprimento, ouve-se na hora a resposta: “Já viu meu neto?”.

Mas, é ela, a avó, quem vai sentir mais falta! Rebolou com ele o tempo todo. Fez uma ligação que toda criança gostaria ter com a mãe de sua genitora. Os avós são mais soltos, não ralham com a criança, permitem que os retratos todos da sala sejam espalhados pelo chão e acompanham o garoto no pula-pula, um dos brinquedos favoritos, acho que descoberto por aqui, em terras esturricadas do Nordeste. Especializou-se, no entanto, em comer pipoca caída no chão.

E por ai vai! Levando nos ares do Atlântico as saudades de nós todos: avós e tias. Mas volta! Vem pra cá – quem sabe? – armar sua barraca de acampamento e fincar os laços de família, os quais vêm de longe, do Barão do Ceará-Mirim e do Visconde de Goiana.

E o quarto que abrigava a mãe - minha filha - e o filho - meu neto - amanheceu vaizo, nem um, nem outra. A avó chorou do aeroporto ao restaurante e lembrou dele, que aprendeu a pedir ao garçon: "Moço: água coco, gelo!". Só ele sabia pedir o conteúdo hídrico da fruta tropical de forma tão peculiar.