segunda-feira, 27 de agosto de 2012

E os Aposentados?

Diversas categorias dos funcionários públicos estão em greve. Pedem melhores salários e exigem condições dignas de trabalho. Por certo se contentam com a primeira reivindicação, porque com a segunda já estão habituados. O governo senta-se à mesa de negociação, junta as lideranças e não chega a acordo. Os professores universitários, que vivem para o ensino, a pesquisa e a extensão e por isso mesmo são obrigados a uma atualização permanente, receberam a oferta de 15%, divididos em três longos anos e a partir de 2013. Uma categoria em tudo sacrificada, que se vira ganhando ordenados inferiores a certos servidores do Senado; gente dos elevadores e da copa.
São esses docentes, formadores de gestores públicos futuros, merecedores de melhores salários, com os quais evitassem preocupações comezinhas. Ordenados que os deixassem livres para o pensar, o investir em aulas e em pesquisas e no esforço da extensão. Mas não, recebem parcas remunerações e se sacrificam, porque, como todo ser humano, precisam cumprir os compromissos do cidadão. Sei de docente que nunca pôde comprar a casa própria e que usa veículo de categoria inferior, velho e carcomido.
Se o Governo não liga para os que estão trabalhando, avalie os aposentados, que lutaram a vida inteira para manter a Universidade, como tantos que conheço. Nesses, nem se fala! Sustentaram o ensino nos anos em que não havia mestrado ou doutorado. Gente que ensinou a muitos, que saia das bibliotecas com poeira até a alma, contanto que publicasse uma pesquisa. Pessoas que de Pernambuco viajaram a São Paulo, onde fizeram um curso incluído dentre aqueles da pós-graduação sensu lato. Curso hoje sem referência nas avaliações internas.
Eu duvido que tratem assim os militares, até porque eles são da reserva remunerada, isto é, podem se convocados a qualquer hora, não importa a idade ou a patente. Eu duvido que um coronel, posto de pijama, ganhe menos que um igual da ativa. E não são obrigados à atualização permanente ou não precisam se engajar na pesquisa e na extensão, sequer no ensino. Não tratam, porque eles têm a chave do urutu ou têm a metralhadora à mão. Podem arquitetar o golpe e estabelecer a ditadura.
 
(*) Artigo publicado pelo Jornal do Commercio, no domingo, 26 de agosto. Um texto que trabalha a questão dos professores universitários aposentados e assim esquecidos pelo Governo. Artigo que é reproduzido, de hábito, pelo Jornal A Besta Fubana. Comentários no espaço mesmo do Blog ou pelos e-mails pereira.gj@gmail.com ou pereira@elogica.com.br 
 

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Um Monumento ao Livro

Estive no Leste Europeu e confesso que fiquei perplexo com o desenvolvimento que aquelas cidades, antes submetidas ao jugo comunista, alcançaram em tão pouco tempo. O muro de Berlim foi abaixo a 9 de novembro de 1989 e daí por diante a liberdade passou a presidir as decisões e o dia a dia da gente daqueles lugares. Insisto com a palavra liberdade, porque era o que se via como objetivo maior alcançado pelas populações. Havia uma pessoa na excursão que indagava, sistematicamente, aos guias, se gostariam de voltar ao regime anterior. A resposta era sempre um “não”, embora reconhecessem que ganhavam menos e que tinham acesso aos benefícios sociais em menor escala.

Mas, era o direito de ir e vir que fazia a diferença para o povo daqueles rincões; rincões de muitas cidades. Ainda pude ver um posto de fronteira, onde eram barrados os veículos que podiam levar viajantes não autorizados. Era um posto abandonado. Mas, a organização das cidades foi um fato que me chamou a atenção. Todas contando com bondes elétricos, que iam e vinham com desenvoltura. Andei em um deles e achei ótimo o deslocamento de um bairro a outro. Não sei as razões pelas quais o Recife acabou com o bonde que cortava a cidade e tinha inclusive terminal em Olinda. Ignoro se os proprietários de ônibus participaram disso.

Em Berlim estive no que ainda resta do velho muro, tirei fotografias para a posteridade, mas vi o espaço que havia entre as duas construções de isolamento, em cujo intervalo morreram tantos que apenas aspiravam a liberdade. Compreendi as diferenças gritantes entre a vida de um e de outro lado. Os apartamentos padronizados, às vezes reunindo várias famílias, com cinco ou seis fogões e igual numero de geladeiras. Um horror! Pessoas estranhas no mais das vezes, sem parentesco e sem amizade anterior. Uma geração que ainda carrega sequelas do autoritarismo, nas pessoas dos guardas fardados como se estivessem sob o regime comunista. Aqueles quepes enormes cobrindo a cabeça, em tudo muito parecidos com os similares da União Soviética.

Mas estive, também, em cruzeiro pelo Mar do Norte e pelo Báltico, atualizando uma geografia que nunca esteve em paz na minha cabeça. Impressionou-me, sobremodo, a Dinamarca, onde a guia, mostrando o Parlamento, apontou o estacionamento das bicicletas dos deputados. Ora que coisa, quase digo, andam por aqui pedalando, qual simples cidadãos do povo, que vão pela manhã ao trabalho? E era isso! Até a Rainha e o Príncipe podem ser vistos nas ruas pedalando uma bicicleta. As ruas de todos os lugares primam pela higiene, pela limpeza, não se vendo buracos ou observando pedaços de papel no chão, embora sejam constantes as pontas de cigarros: fuma-se muito em todo canto.

Em todas as cidades que passei, de Budapest a Talin, a cultura é um ponto forte. Observei que havia sempre, em horários diferentes, concertos nas igrejas e nos teatros, como havia, também, peças sendo levadas e sessões de cinema de arte. Vi em Talin, em certo passeio turístico, um templo Luterano medieval conservado integro, para que as gerações de um futuro que já chegou vejam como se fazia o culto naqueles tempos do medievo. É interessante como as igrejas evangélicas repetem o catolicismo, inclusive com veneração aos santos.

Vi em Berlim um monumento interessantíssimo. Uma escavação no solo, coberta por uma vidraça, através da qual se podia ver algumas estantes, vazias completamente. Representa os livros que foram queimados por Hitler depois da tomada da cidade, sobretudo da universidade, onde estava o vão. Marejei os olhos! E os que foram sacrificados no holocausto estão homenageados em terreno grande, repleto de tumbas, as quais lembram os trucidados em nome do nada.

E o Portão de Brandemburgo sob a inspiração da deusa da paz, Irene de prenome, preside a tranquilidade da Alemanha de agora.







(*) - Crônica publicada originalmente na revista Algomais. As fotografias que ilustram o texto são do autor ou de sua esposa (Zaina). Atentem para a do templo luterano, no qual subi no púlpito e de lá tiraram o meu retrato. Talvez cumprindo o desiderato vocacional. O artigo é habitualmente reproduzido no jornal virtual A Besta Fubana. Desejando o leitor comentar, o faça no espaço mesmo do Blog ou se utilize dos e-mails: pereira.gj@gmail.com ou ainda pereira@elogica.com.br



domingo, 12 de agosto de 2012

Mãos de um velho

           O meu imaginário toma corpo nesse dia dos pais; toma corpo e ganha os ares, viaja como se fora o pássaro dos anos e vai resgatar lá atrás a figura de meu pai.  Consigo me transportar até o começo de tudo – os meus inícios – e vou me encontrar na casa em que nasci, na rua em que me criei, cresci e de menino me transformei em adulto. Nessa trajetória toda tive a meu lado sempre um personagem ao mesmo tempo real e fictício. Real, porque presente a cada minuto e a cada dia de meu ser. E fictício pelo preenchimento das fantasias de minha imaginação; fictício por ser um gigante idealizado aos olhos da criança. Um gigante que se tornou tão frágil no tempo da finitude. Tão frágil e tão medroso com as coisas da eternidade, com futuros que eram mais de seus temores religiosos, que de sua atuação nesse mundo de Deus.
            Eu era um menino, tão menino, ele um jovem que sustentava pela mão o filho imberbe ainda, levando-o aqui e acolá. Gostava quando participava com ele de uma conferência, ouvindo Mário Melo ou escutando com atenção um Agamenon Magalhães ou outro qualquer de seus agrados. Falas que eu não compreendia direito. Antevia futuros, talvez, promovendo essa aproximação precoce do filho com a palavra, com a intelectualidade. Não soube de meus livros, de minha eleição para a sua Academia, ocupando justamente a cadeira de número 16, que fora a sua. Não soube também de seus livros, publicados depois que se encantara, in memoriam, como se diz no comum das coisas. E não soube de seu próprio centenário, assinalado com uma conferência magistral de uma conterrânea, que escreveu tese sobre si.
            É isso mesmo! Hoje o meu pensamento está assim, dividido, por um lado o meu pai, encantado já há tanto tempo, vinte anos na contabilidade das ausências, e eu, pois que sendo pai, hei de almoçar com os meus, vou provar do bacalhau feito pela filha mais velha, primogênita da prole, mais vou levando a tiracolo a outras duas e mais a mulher de meus sonhos; de meus sonhos físicos e de meus sonhos espirituais e humanísticos. Por lá estarão o meu genro, Gonzalo de prenome e o meu neto, Pablo, El campeón. A vida é dessa forma, as pessoas vão passando com o tempo, o relógio dos anos carrega de um por um, deixando claros incríveis e vai trazendo gente que se acresce à família; gente que faz crescer a chamada constelação parental.
            A saudade é grande, sobretudo do tempo de criança, das idas e vindas ao parque 13 de Maio, das mãos dadas, como se isso nos ligasse definitivamente. Como se isso desfizesse por antecipação os desentendimentos no campo do social ou na seara do político. Aquelas mãos de antes ficaram tão velhas e tão marcadas, que eu as olhei certa vez em derradeira visão, para não esquecer nunca: mãos de um velho. Agora, vejo as minhas mãos e as comparo com aquelas, não há diferenças. Eu também estou velho!
           

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

As diferenças no hoje das coisas

Na vida tudo está diferente, essa é que é a grande verdade. Nos subúrbios as habitações com jardins e grandes quintais não existem mais, tombaram, vergaram à força da demolição e os lotes foram reunidos para que se possa construir um espigão a mais em cada recanto da urbe. São prédios e mais prédios nos bairros da classe média, espetando o solo, como se o mundo fosse uma grande tábua de pirulitos. Não há sistema de esgoto ou de água que possa dar conta dessa febre na construção civil. O meio ambiente também não suporta tanta mudança e tanto concreto esquentando os ares urbanos. A água, o bem maior da humanidade, corre poluída, contaminada por dejetos humanos, imprestável para o consumo potável.

O desenvolvimento da ciência e da técnica não se fez acompanhar pela humanização da criatura, antes o contrário. Os vizinhos de prédio, ocupantes dos apartamentos de agora, são diferentes dos antigos moradores da casa ao lado ou daqueles de uma mesma rua. Folguedos curtidos pela comunidade inteira como o Natal e o Ano Novo, assim como o São João e o Carnaval, são, atualmente, festas quando muito da família e nunca envolvem os demais. Nas comunidades verticais – os edifícios -, o elevador, que passa lotado todas as manhãs, conduz gente no mais das vezes, estranha entre si. No máximo um cumprimento formal e lá segue o veículo de todas as verticalidades. No final do ano, por vezes, uma ceia congrega o condomínio por seus integrantes, raramente contando com a presença de todos.

Nas últimas cinco décadas – pouco menos de seis décadas talvez – a humanidade vem assistindo e, sobretudo, vivenciando extraordinárias transformações, as quais têm contribuído para as mudanças nos estilos e na qualidade ide vida do homem. Nunca a ciência e a técnica avançaram tanto como nos cinquenta ou nos sessenta anos que se passaram, colocando a serviço da criatura recursos que fogem até ao poder do imaginário, de cuja força criadora nasceram os relatos da ficção científica, muitos dos quais materializados depois.

A informática revolucionou o mundo, inserindo a máquina em todas as atividades, desde aquelas de natureza estritamente doméstica às de cunho laboral, facilitando tudo. Assim, o microcomputador ocupa hoje lugar importante na casa de muitos e no trabalho de todos ou de quase todos, processando a informação nos mais diversos níveis, do gerenciamento de dados à virtualidade da inteligência artificial, que não vem para superar as potencialidades humanas, mas para contribuir no aperfeiçoamento cada vez maior da produção.

(*) Meus caros e distintos leitores. O texto de hoje é uma parte de um livro que hei de terminar. Aliás, hoje fui buscar as provas de outro, no estilo corrente de crônicas e com o título de: Crônicas Virtuais. Ficou lindo! Vale pela capa, ao menos. Conto com a presença de todos nos jardins da Academia de Letras, em setembro. Este outro, do qual publico uma pequena parte, será um ensaio e abordará o que vi e o que vivi nos meus anos de existência no século XX, um tempo de mudanças e transformações. O Blog é reproduzido no jornal A Besta Fubana. O autor agradece aos leitores que comentarem.