segunda-feira, 27 de abril de 2009

Suplente do Cachorro


Estou em Madri! Chequei no dia de ontem! Espero por aqui o meu neto, Pablo de prenome. Vou rever a cidade e hei de passar no Museu do Prado e ao Centro de Artes Rainha Sofia , além do que realizar algumas pesquisas na Biblioteca Nacional de Espanha.
Lembrei da velha história – verdadeira, como indicam as evidências – que contava a minha avó paterna; a história da Nau Catarineta, quando um gajeiro sobe no mastro e grita, a plenos pulmões: Alvíssaras, Capitão, meu Capitão-General/Já vejo terras de Espanha, areias de Portugal. Foi o que vi: areias de Portugal e depois terras de Espanha. Mas, no aeroporto de Lisboa – não podia ser diferente – aconteceu o inusitado. É sempre assim! Comigo as coisas são, em tudo, especiais. Dispararam os alarmes do embarque. E o atencioso português logo indagou: “Falas português?”. Dei-lhe a resposta que desejava ouvir: “Sim! Desde a mais tenra e incompleta idade!”. E ele me revistou da cabeça aos pés. Até as partes mais vergonhosas foram examinadas. Eu parecia um traficante do morro do Alemão chegando à Lisboa de todos os fados. Cumpri, imóvel, o desiderato da hora. E o guarda foi testando o que encontrava, o cinturão e o suspensório, a caneta e as moedas. Passou a mão em mim todo. Fosse eu uma mulher, o acusaria de assédio. Fosse criança, o chamaria de pedófilo.
Viagem cansativa essa, pensava no trajeto, horas e mais horas – 6h30 de vôo – na aeronave, as pernas encolhidas, sem possibilidade de serem estiradas e a cabeça a mil, querendo “viajar” também nos ares da fantasia, lembrando outras passagens e projetando outros futuros. Foi quando me veio à mente um momento para mim de quase trágico e a comédia daquela hora. É que em 2005 passei 5 meses doente e terminei sendo operado da coluna, numa intervenção cujo sucesso devo a Geraldo Sá Carneiro, cirurugião de mão cheia e ser humano de um altruísmo invejável. Pois é, tive ocasiões de delírio e numa dessas situações, não sei porque cargas d’água, achei que estava em Lisboa. Depois de ter feito um curto trajeto de Kombi, estava numa sala na qual ia ser submetido a um ecocardiograma. Foi uma pândega!
Primeiro porque achei que estava tomando o lugar de um cachorro, o qual, marcado para entrar antes de mim, cedera a vez. Que coisa! Mas, deitado na mesa de exame e vendo chegar o profissional médico – meu colega então –, disse-lhe em bom português: “Colega lisboeta! Cheguei aqui em pouquíssimos minutos! E fico pensando o que diria Cabral, se disso soubesse, pois que levou meses para chegar ao Brasil!”. E o médico, perplexo com o que ouvira, nada conseguia responder, senão uma expressão evasiva: “O seu médico lhe dirá qualquer coisa!”. Depois, quando o exame começou a ser feito, a captação do ruído de meu coração era assim: “Au!. Au!. Au!”. Isso me fez lembrar o hipotético cão, o mesmo e que me cedera o lugar, e de forma compungida pedi ao colega: “Nobre colega! Atenda esse cão em seguida, ele me cedeu a vez!”. E o médico, enrolado, inseguro, entre medroso e admirado, repetia: “Converse com o seu médico! Converse com o seu médico!”. E sobre isso nunca conversei, confesso!
(*) - Crônica escrita em Madri, usando o computador de minha filha, sem facilidade com o teclado e sem a ajuda do corretor automático do vernáculo. Comente aqui, neste espaço mesmo do Blog ou o faça para pereira@elogica.com.br ou ainda para pereira.gj@gmail.com