segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Carta ao neto

Meu adorado neto Pablo 

Você ainda não sabe, porque é muito pequeno para entender essas coisas, mas quem escreve costuma descarregar as emoções assim, produzindo um texto que lhe console a alma, o espírito. É o que faço agora! O silêncio aqui em casa dói em meus ouvidos e ontem, sem suportar mais a dor da saudade, que está me roendo o coração, sentado, como estava, no sofá de couro da sala, o mesmo em que nos sentamos tantas vezes e no qual você, meu querido neto, encostava a sua cabecinha em meu ombro, sem entender a minha cantoria: “Encosta tua cabecinha no meu ombro e chora...” e chorei. Chorei quase que compulsivamente, afinal você se foi, tomou o avião da Gol, tão celebrada por você e foi aterrissar em São Paulo. Acompanha, como deve ser, pai e mãe transferidos para o Sudeste. Deus os proteja nessa jornada que ora se inicia! 
 
Chamei a sua avó, ontem mesmo, sob a justificativa de tomar um café e saímos. Eu não estava interessado na refeição, mas precisava sair e desparecer, sair desse ambiente silente, sem sonoridade, porque tudo aqui lembra você. E nós saímos! Depois assisti um filme e me fez falta não ouvir a sua voz pedindo: “Vô, vem me colocar pra dormir!”. E eu ia, contava as mesmas histórias que contei para as minhas filhas, para as três, falando sobre as bruxas Alceia e Memeia, dizendo que havia um filho de nome Francisco Bruxooco e recomendando assim: “Vire pra lá e cama!”. E você dormia! Se eu saísse ouvia a sua reclamação: “Vô conta outra história!” E eu contava! Passei no Paço da Alfândega, com ela, com a sua avó e nos lembramos da última vez em que estivemos ali, os três. Assistimos a uma encenação do Natal e você se admirou muito com os atores subindo e descendo pelas paredes do Shopping. 
Interrompi esse texto duas vezes, meu querido neto, para chorar. E estou ameaçado de interromper outra vez. Só por isso eu vou parar de escrever. Deixar como está. Preciso acabar com isso! Enfrentar a falta, o vazio, os quartos com as portas escancaradas, sem ninguém. A viagem se deu por ser necessária e todos serão felizes em São Paulo. Pior seria!

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Do Réveillon e de Tambaba


Foi uma passagem de ano singela, talvez a mais simples de todas em minha vida, mas, com toda certeza, a mais feliz, a mais agregadora e a mais afetiva. Afinal, estávamos todos juntos: a esposa, as filhas, os genros e os netos. Foi uma experiência ímpar! No alto de uma colina vimos o espocar dos fogos e ali nos abraçamos todos, desejando felicidades no porvir das coisas. Um espetáculo luminoso também muito simples, bem distante dos executados nas grandes cidades, do Rio de Janeiro ou mesmo do Recife. Estava começando o ano, depois de ter findado outro, como acontece desde que o mundo é mundo. 
Fizemos o exercício de juntar a todos e partimos em dois carros para a paradisíaca praia de Carapibus, no município de Conde, domínios da Paraíba. Chegamos por lá com o sol caindo no horizonte e fomos admirar o entorno da Pousada Laguna, que nos acolheu da melhor forma. O pequeno hotel, de cinco quartos, se muito, encontra-se no alto de uma serra, cuja descida, íngreme como é, obriga o turista a utilizar-se do máximo de sua força física para subir de volta ao topo do lugar. Mas, vale a pena descer, porque a vista do mar é extraordinária. O oceano enorme estava subindo e em sua maré alta dava a impressão de querer levar tudo a sua volta. Beleza aquela visão!  
Daí por diante foi só beleza e mais beleza. Tudo conforme se dizia por cá, nesta selva de pedra em que vem se transformando o Recife; selva de pedra e de carros engarrafados. Na barraquinha de beira-mar, enquanto degustávamos o peixe serra que resgatava outros momentos e outras praias maravilhosas, os netos se fartavam com o vaivém das ondas do mar. Uma de 9 meses, que faz o mais velho, nos seus 4 anos de vida, dizer que ela tem apenas “zero anos”. Veja só o leitor! Foram esses dois os que mais aproveitaram da estadia e a menor quase aprende a chamar pelo vovô coruja. Júlia e Pablo, ela brasileira e ele espanhol  de nascimento, divertiram-se a valer, no mar e fora dele.  
No penúltimo dia, fomos à Tambaba, praia ainda mais bonita que a outra, sem a necessidade de se tirar as roupas ou os adereços. O mar estava entrando na preamar e em pouquíssimo tempo encheu; encheu do conteúdo hídrico e encheu de gente. Em poucos minutos o local estava repleto de farofeiros e turistas. Uns atravessavam a barreira da indumentária e outros não. Uma mulher imensa de gorda, com a barriga pedindo misericórdia a Deus e as mamas de um volume descomunal, usava “fio dental”, tendo tomado a decisão de ultrapassar a barreira que separava os adequadamente vestidos, daqueles que se aventuravam na condição em que se apresentaram como vieram ao mundo.