sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Trotes telefônicos e outros trotes

 Eu sou vidrado em trotes telefônicos. Comecei pedindo a uma padária - já se vão 50 anos - 100 pães para a vizinha. Já dei trote em todo mundo e seu Raimundo! Desses, talvez aquele em que liguei da extensão de casa, menino ainda, e falei com minha Tia Deolinda, parece ter sido o mais criativo. Ela atendeu o telefone e eu disse que falava diretamente do Purgatório. Indagou se já ligava de lugar assim, eternamente distante? Estamos em experiência, respondi justificando, e expliquei que no espaço do galinheiro havia uma botija. Fosse por lá e cavasse, mas sem permitir a presença de outra pessoa. Claro que corri pra junto e vi a pobre da velha com uma enxada nas costas, mandando que eu saísse de perto. Assim: “Saia! Saia daqui! Saia!”. E não houve jeito de admitir que tinha sido eu o protagonista da ligação.
Já contei por aqui o telefonema que fiz para uma clínica veterinária, falando um espanhol atrapalhado e imitando a voz de um dono de circo. Dizia que o elefante estava com uma diarréia incontrolável, que já tinha tomado 34 vidros de Kaomagma, sem resultado e que eu estava disposto a levar o bicho para a clínica, deixá-lo internado. A pessoa que atendeu (não era o veterinário) quase enlouquece, justificando que cuidavam somente de cães e gatos. Não tinham espaço maior que coubesse um animal assim, tão grande e tão exigente em cuidados. Eu insistia de um lado e o interlocutor se justificava de outro. No fim, no fim, sem um acordo que fosse, fecharam a clínica naquele dia. Melhor dessa forma, pensaram!
De outra feita, tendo descoberto que o meu telefone fixo tinha uma secretária eletrônica, facilidade que não se usava de hábito, resolvi deixar, eu próprio, recados e observar a reação das pessoas. Com voz gutural disse: “Nos velhos mosteiros de Olinda os monges ainda se cumprimentam assim: lembrai-vos da morte!”. E pedia, ao final, que o interlocutor de ocasião deixasse o seu recado. Muita gente deixou exclamações, como aquela: “Liguei para a casa de um padre!”. Numa ocasião fiz um inquérito sobre o que achavam do Padre Marcelo Rossi. Encontrei respostas diversas. A melhor foi: “Eu gosto do padre e das coisas que ele diz!”. Por fim, em determinado dia de finados, data de aniversário de meu avô paterno, disse: “Orai pelas almas que sofrem no Purgatório, no meio a de meu avô Fausto!”. E houve quem começasse uma ave-maria.
Mas, dentre os outros trotes, isto é, trotes que não foram telefônicos, esse foi demais da conta. Numa tarde fui ao colégio disposto a repetir o que certo aluno fizera com meu pai. Quando o professor de geografia fez a chamada, ao dizer meu nome, ouviu em gregoriano legítimo: “Preeeeeeesente!”. Fui expulso da sala de aula para tomar jeito e ter respeito pelos mais velhos, sobretudo se estiver diante de um mestre. Quando inventei que o dia era o do aniversário do mesmo professor, ele negou de forma peremptória e chegou a consultar o calendário, ao que expliquei: “O senhor está se guiando pelo calendário gregoriano e eu sigo o calendário Juliano!”. Na sala ninguém se aguentou e foram cantados os parabéns e a aula do dia devidamente morta.