sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Bezerra Coutinho - Um Sábio Pernambucano do Século XX

Há um tempo em que o homem vai reunindo experiências alheias e juntando essas vivências nos escaninhos de sua própria intimidade, para melhor forjar os traços de caráter e as características de sua personalidade. Depois, na autonomia do ser e do fazer, passa a contribuir, também, para o bom andamento das coisas; as suas próprias coisas e aquelas da sociedade como um todo. Nesse particular, é capaz de contabilizar as influências que lhe impulsionaram no exercício do existir, marcando-o com os sinais do bom combate. Sem dúvida alguma, os pais têm aqui um papel decisivo. Ninguém ignora o tanto que deve ao pai e à mãe na mescla de ensinamentos que a vida pôde reunir.
De meu pai recebi o exemplo de dedicação à família, do trabalho como forma de sustento e manutenção, como também recolhi as lições da ética e da moral, as minhas diretrizes no hoje da vida, diante dos impasses que se apresentam num cotidiano, às vezes, atribulado. Ainda hoje me surpreendo usando o palavreado dele. Sou um pouco ele na fala do cotidiano e nos momentos públicos em que devo me pronunciar. E de minha mãe assisti à abnegação diante da prole, frente às dificuldades de saúde ou quando os primeiros impasses nas relações de amizade ou de amor abalavam a integridade de meu ser. E pela vida a fora fui captando, aqui e ali, as formas diferentes de viver e de conviver dos meus semelhantes, fazendo questão de absorver o que havia de bom e rechaçar os defeitos que também estão presentes no existir de cada um.
Os meus mestres tiveram uma influência decisiva em mim. Fui colhendo peculiaridades em cada um deles, desde a simples forma de se comunicarem à profundidade com que transmitiam o saber. Talvez desejasse reunir o verdadeiro caleidoscópio de predicados ou de qualidades num único ser humano. É claro que não consegui, mas devo confessar, há alguma coisa de cada um na minha integralidade. Por isso, dedico esse texto hoje ao Prof. Aluizio Bezerra Coutinho, um dos homens de inteligência mais acurada e de cultura mais apurada em Pernambuco, durante o correr do século XX. Poucos me impressionaram tanto quanto ele! Um médico que se apresentava como biólogo; um biólogo que discutia também aspectos culturais da criatura. E um humanista com ares de cientista.
Com ele aprendi os princípios que regem a natureza, entendi que a vida originou-se a partir de cristais aperiódicos, dentre os quais, certamente, os fragmentos de mica e as partículas de argila, talvez para confirmar o que está escrito e inscrito na Bíblia, o Livro dos livros. E com ele entendi que o homem é o resultado do aperfeiçoamento das espécies ao longo dos milhares de anos, quando a evolução fez com que a seleção natural conservasse alguns espécimes e descartasse outros por motivos diversos. E não há razão para se afastar disso tudo a interferência de Deus, haja vista o fato de que a criação do Universo não teria sido possível sem a participação de uma força superior, capaz de ultrapassar as leis naturais.
De igual forma, não há porque desprezar a interveniência divina no processo de evolução e de seleção natural das espécies, especialmente a interveniência do Criador no estabelecimento da condição humana à criatura nascida à semelhança do Pai. É que em determinado momento foi preciso dotar o ser que vinha emergindo nesse processo de aprimoramento das espécies de uma alma e assim foi feito, como forma de se ter a inteligência à disposição da humanidade, o livre arbítrio também, além de outras características do homem. Deus quando faz as coisas não precisa de mágicas, mas pode se utilizar, apenas, do que é corriqueiro e do que é compreendido pela natureza humana.
Bezerra Coutinho, homem de ciência e antecipador de um pensamento biológico próprio, era um humanista na mais larga acepção da palavra. Humanista porque capaz de escrever uma tese sobre a casa tropical, mal terminara o seu curso médico ou porque escrevera, com 22 anos somente, um ensaio sobre o Romantismo. E pela devoção que emprestava às outras manifestações do espírito. Foi um homem voltado para as coisas da natureza, cultivando em sua casa orquídeas e outras plantas assemelhadas. Cultor do bom vinho e ouvinte da boa música. Tudo isso junto, a matemática de seus cálculos, a ecologia de suas antecipações, a patologia de suas aulas e a sistemática investigação dos fenômenos científicos, com a crítica devida a determinados conceitos, fizeram do homem um ser múltiplo, plural, nessa singularidade do comum.

(*) - Uma crônica sobre as influências que recebi na vida. As de meu pai e aquelas de meus mestres, dentre os quais Aluizio Bezerra Coutinho. Mas outros também, como Ruy João Marques, Amaury Coutinho e Salomão Kelner. O último muito de meus convívios e de minhas convivências. A esses o texto de agora. Comente no espaço mesmo do Blog ou para pereira@elogica.com.br ou para pereira.gj@gmail.com